Contrafação rouba 22 mil empregos à economia portuguesa

O Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia contabiliza que, em onze setores de atividade, as perdas nas vendas ultrapassem 1,15 mil milhões de euros.

A contrafação e a pirataria causam perdas às empresas europeias na ordem dos 60 mil milhões de euros. E são responsáveis pela perda de 480 mil postos de trabalho, de acordo com o Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO). "Os fabricantes legítimos produzem menos do que o que produziriam se não existisse contrafação, e empregam menos trabalhadores", refere o relatório 2019 Status Report on IPR Infringemen", divulgado no Dia Mundial da Propriedade Intelectual, que se assinala nesta quinta-feira, dia 6 de junho.

Portugal está acima da média europeia em termos de perdas: a contrafação e a pirataria roubam 9,5% de todas as vendas, contra 7,4% na União Europeia, custando à economia portuguesa cerca de 1,15 mil milhões de euros. São 111 euros por ano por cada português.

"Perdem-se mais de 22 mil postos de trabalho em Portugal, sendo o vestuário, calçado e acessórios o setor mais afetado", com perdas na ordem dos 653 milhões de euros, explica Luis Berenguer Giménez. Em segundo surge a indústria de cosméticos e cuidados pessoais, com perdas de vendas na ordem dos 145 milhões. "Em Portugal, a contrafação no setor de cosmética e cuidados pessoais tem vindo a aumentar - situa-se nos 15,1% de perdas de vendas, comparado com as perdas de 10,6% na União Europeia."

A análise foi feita tendo em conta uma metodologia baseada em dados oficiais dos diferentes Estados membros, além de recurso a dados do Eurostat, entre outros organismos. "Olhamos para aquilo que deveria estar lá, as vendas totais em setores particulares, e para aquilo que lá não está - as vendas que deveriam ser feitas mas não são", explica Luis Berenguer Giménez, head of service e porta-voz da EUIPO, além de advogado dedicado à área da propriedade intelectual.

Recorrendo a estes dados, é feita a estimativa para onze setores de atividade, considerados pela agência europeia como "fundamentais" para a economia: cosmética e cuidados pessoais; vestuário, artigos de desporto; brinquedos e jogos; artigos de joalharia e relojoaria; malas de mão e viagem; indústria discográfica, bebidas espirituosas e vinhos; medicamentos; pesticidas e smartphones.

O barato sai caro
Luis Berenguer Giménez diz "conseguir compreender a abordagem de que é melhor ser barato", mas que é importante olhar para o outro lado da moeda. "Veja-se o caso de brinquedos, cosméticos ou até medicamentos falsos. Aplicaria no seu filho um protetor solar que não é verdadeiro, por exemplo? Um produto falso não é alvo de auditorias nem passa por controlos de qualidade como outros produtos. O mesmo aplica-se a brinquedos falsos - também não deixaria o seu filho brincar com um brinquedo que não foi alvo de controlo de qualidade. E medicamentos? No melhor cenário, um medicamento falso pode criar somente um efeito placebo."

Para o porta-voz da EUIPO, é importante que relatórios como este alertem o consumidor para a existência deste negócio, paralelo à economia. "Temos de criar consciência e alertar o consumidor para que, às vezes, comprar barato chega até a ser perigoso para quem compra. Não é só a questão de ser prejudicial para a sua própria economia e para a dos países vizinhos."

"A primeira coisa que temos de fazer é aumentar a consciência do mercado e dos consumidores, da sociedade civil. Isto é uma parte muito importante, porque não podemos deixar isto passar como algo normal, tem impacto na economia e nos postos de trabalho, nas diferentes economias europeias."

Sendo uma agência descentralizada da União Europeia, com sede em Alicante, Espanha, o instituto reconhece que "não tem autoridade para implementar leis", mas que a divulgação de relatórios como este é um passo para aumentar a consciência sobre o mundo da propriedade intelectual. "Aquilo que podemos fazer é harmonizar o trabalho de todos os atores que têm uma palavra a dizer nesta luta contra os produtos contrafeitos - juízes, polícia, alfândegas... Damos algum tipo de formação para ajudá-los a abordar o tema. Claro que a contrafação não é uma questão territorial, é um elemento que se expande pelo globo e temos de harmonizar a abordagem feita nos Estados membros da União Europeia - e isso é algo que fazemos."

Uma das abordagens para lidar com este mundo, na lógica da EUIPO, seria a implementação de leis mais severas, "com mais penalidades". "Temos reparado que a contrafação europeia está ligada a todo o globo - e, em muitos casos, está ligada a outras atividades do crime internacional, como lavagem de dinheiro ou outras atividades ilegais." "O mundo da contrafação cresce porque os benefícios são gigantes e, caso sejam apanhados, as leis não são tão severas como em outros crimes. Diria até que seria mais proveitoso entrar no mercado da contrafação do que noutras atividades ilegais", conclui Luis Berenguer Giménez.

Fonte: Diário de Notícias
Foto: Amin Chaar/Global Imagens