O papel do juiz no cumprimento das obrigações: a sanção pecuniária compulsória - Vânia Filipe Magalhães
A sanção pecuniária compulsória constitui uma figura jurídica com relevância jurisdicional por emergir da função de julgar no âmbito do cumprimento das obrigações. O presente artigo aborda a sanção pecuniária compulsória, nas modalidades judicial e legal, e pretende constituir uma ferramenta útil para a sua aplicabilidade nos tribunais.
I. Introdução
O tema do cumprimento coercivo das obrigações assume-se como vértice da tutela jurisdicional efectiva constitucionalmente consagrada no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos (n.º 1), devendo a lei assegurar aos cidadãos os procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos (n.º 5).
Os tribunais assumem um papel imprescindível no desiderato mencionado, aos quais compete administrar a justiça em nome do povo e assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados (cfr. artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa e artigos 2.º e 152.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
O presente estudo visa abordar a temática da sanção pecuniária compulsória, nas suas vertentes judicial e legal, que se traduz na realização do direito através da nobre função de julgar.
A simplicidade da redacção do artigo 829.º A do Código Civil, que prevê a sanção pecuniária compulsória, convoca questões substantivas e processuais relevantes para a apreensão do instituto, às quais se tentarão dar resposta numa perspectiva prática, sem olvidar as discussões teóricas que lhe estão subjacentes, tanto mais que, como sufraga Calvão da Silva, o instituto da sanção pecuniária compulsória “é de natureza substantiva, sendo de natureza adjectiva, de carácter formal-processual, apenas a sua actuação”.
II. Generalidades
1. O juiz como garante da composição dos litígios
Constituindo a justiça umas das tarefas essenciais num Estado de Direito Democrático, compete aos juízes dirimir os conflitos públicos e privados, com independência, imparcialidade e isenção, de acordo com as fontes de direito a que devem recorrer nos termos da Constituição e da lei, bem como fazer executar as suas decisões (cfr. artigos 3.º, n.ºs 1 e 2, 4.º e 6.º C, do Estatuto dos Magistrados Judiciais aprovado pela Lei n.º 21/85, de 30 de Julho).
Um dos afloramentos da competência dos juízes de fazer executar as decisões radica, precisamente, no instituto da sanção pecuniária compulsória, na medida em que aquelas decisões são obrigatórias para todas as entidades públicas (…)
O presente artigo foi publicado na Revista Julgar em Dezembro de 2022