Nunca se esperou tanto pelas decisões dos Julgados de Paz

Tempo médio de resolução dos processos é de cem dias, mais 24 do que há cinco anos. Número de novos casos está em quebra, mas satisfação dos utilizadores é muito elevada.

Os Julgados de Paz demoram, em média, cem dias a tomar decisões sobre os processos que lhe estão entregues. Este é o tempo de resolução mais elevado desde 2002, quando estas instâncias foram criadas com a intenção de tornar mais rápida a resposta a casos jurídicos de natureza cível de menor dimensão.

De acordo com o último Relatório Anual do Conselho dos Julgados de Paz estas instâncias precisavam, em 2013, de 76 dias para tomar uma decisão sobre os processos. Em 2017, ano a que se refere o documento, esse prazo tinha aumentado 24 dias.

O relatório oferece outros indicadores que mostram como os Julgados de Paz têm vindo a perder capacidade de resposta. O número de processos pendentes aumentou entre 2013 e 2017. Os 4449 processos ainda sem resolução que se verificavam no final do ano para o qual existem dados mais recentes representam um crescimento de quase 24% face ao início desse período. A “taxa de eficácia” apresentada no documento tem também uma quebra de 5% em relação ao ano anterior.

Estes indicadores são reflexo “da falta de meios, não só humanos, como também físicos” que afectam estas instâncias, considera a deputada do CDS Vânia Dias da Silva, que é a representante daquele partido no Conselho dos Julgados de Paz. “Há recursos materiais que estão obsoletos”, acrescenta.


Em alguns casos, “há sentenças que demoram um ano a sair”, prossegue Vânia Dias da Silva. “Com tempos de espera deste tipo, as pessoas preferem ir directamente aos tribunais”.

Não foi possível ouvir nenhum dos representantes dos partidos de esquerda no Conselho dos Julgados de Paz. Helena Pinto, indicada pelo Bloco de Esquerda, aguarda substituição e o representante do PS, António Ramos Preto, tomou apenas posse a 20 de Fevereiro.

O Ministério da Justiça afirma estar a trabalhar “em novas ferramentas que resultarão na melhoria do serviço de justiça de proximidade prestado por estes tribunais”, como uma nova aplicação informática que permitirá um melhor acesso dos cidadãos aos respectivos processos e maior celeridade nas notificações e citações. Essas mudanças vão permitir uma “melhoria dos tempos de tramitação dos processos”, espera a tutela.

Até meados de 2017, seis dos 25 Julgados de Paz não tinham juiz titular, sendo liderados por magistrados em regime de acumulação de funções. Em Julho desse ano, foram empossados cerca de uma dezena de novos juízes, que permitiram mitigar algumas das dificuldades sentidas, de acordo com o relatório. Mas “foram demasiados anos com falta de Juízes de Paz”, lê-se no mesmo documento. Desde então, tomaram posse outros nove juízes.

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Até meados de 2017, seis dos 25 Julgados de Paz não tinham juiz titular, sendo liderados por magistrados em regime de acumulação de funções. Em Julho desse ano, foram empossados cerca de uma dezena de novos juízes, que permitiram mitigar algumas das dificuldades sentidas, de acordo com o relatório. Mas “foram demasiados anos com falta de Juízes de Paz”, lê-se no mesmo documento. Desde então, tomaram posse outros nove juízes.

Os 25 Julgados de Paz cobrem uma população de 3,4 milhões de pessoas, cerca de um terço da população nacional. Nos últimos quatro anos, foram criadas duas destas instâncias, uma da região Oeste, servindo 12 concelhos, em 2017, e outro em Santa Cruz, na Madeira, que abriu no início deste ano.

Os Julgados de Paz são tribunais, financiados pelo Ministério da Justiça e pelas autarquias, que se destinam à resolução de casos de natureza cível, cujo valor não exceda os 15 mil euros, excluindo os que envolvem matérias de Direito da Família, Direito das Sucessões e Direito do Trabalho. Nestas instâncias, os processos – ligados aos direitos e deveres dos condóminos, incumprimento de contratos e obrigações, pedidos de indemnização cível em virtude da prática de crime quando não é apresentada queixa, entre outros – são, em média, terminados em três meses. Apesar de parte dos conflitos ser resolvida via julgamento, a maior parte faz-se através da mediação.

Os dados não permitem estabelecer um nexo de causalidade entre esta menor eficácia e a confiança da população dos Julgados de Paz. No entanto, o relatório de 2017 reforça uma tendência que já tinha sido observada em anos anteriores: há cada vez menos pessoas a recorrer a estas instâncias.

No ano a que se refere o relatório, entraram 7775 novos processos, o que representa uma quebra de 4% face ao ano anterior e de 27% em relação a 2013, ano para o qual são apresentados os dados mais antigos neste relatório.

As estatísticas relativas a 2018 – ainda em consolidação e que só devem ter publicação oficial no início do Verão – mostram que, no último ano, o número de processos entrados nos Julgados de Paz aumentou. De acordo com os dados enviados ao PÚBLICO pelo Ministério da Justiça, houve 8161 novos processos em 2018, mais do que em qualquer um dos dois anos anteriores.

Apesar destes indicadores, a experiência de quem recorre aos Julgados de Paz é positiva. De acordo com um outro documento, que foi publicado na semana passada, o Relatório de Acompanhamento dos Meios de Resolução Alternativa de Litígios – que é produzido há seis anos pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa com base em inquéritos respondidos pelos utilizadores destes serviços –, o nível de satisfação dos utentes dos Julgados de Paz tem vindo a aumentar.

A satisfação dos utentes é medida através de uma avaliação, de 0 a 10 pontos, de 24 indicadores. Face a 2013, a média dos indicadores aumentou 0,54 pontos.

Nos Julgados de Paz, os utentes classificaram quase todos os indicadores (20 dos 24) com um valor médio entre nove e dez pontos, “correspondendo a um nível extremo de “muita satisfação””, de acordo com o relatório. Os outros quatro indicadores – que dizem respeito à facilidade de acesso, sinalização interna, condições de espera e equipamentos das instalações dos Julgados de Paz – tiveram um desempenho um pouco inferior, apresentando um valor médio entre oito e nove pontos, que corresponde ainda assim ao nível de “muita satisfação”.

Fonte: Público