Gomes Canotilho diz que contribuição de solidariedade é inconstitucional
O professor Gomes Canotilho considera que a CES é um "imposto de classe" em parecer que arrasa as teses do Governo
O constitucionalista Gomes Canotilho considera que a "Contribuição Especial de Solidariedade" (CES) que o Orçamento de Estado impôs às pensões de reforma é inconstitucional, por se tratar de um verdadeiro "imposto de classe" que atinge apenas os reformados e pensionistas.
"Trata-se de um novo imposto sobre o rendimento dos pensionistas, por sinal criado à margem dos princípios e regras constitucionais", escreve o professor de Direito, num extenso parecer, redigido a 16 de Janeiro, a que o Expresso teve acesso. Canotilho considera que a CES "conduz a uma excessiva desigualdade de tratamento entre rendimentos de diversas categorias", pelo que viola o princípio da igualdade, e que as suas elevadas taxas de tributação assumem um "manifesto caráter confiscatório".
O constitucionalista pronuncia-se pela não conformidade com a Constituição da referida contribuição, à luz dos princípios da igualdade e capacidade contributiva, proporcionalidade, unicidade, segurança jurídica, proteção da confiança dos cidadãos e princípio orçamental da não consignação de receitas.
Não se pode legislar com ligeireza
Para além disso, Gomes Canotilho insurge-se contra os argumentos que consideram que "a lei de salvação pública é a lei suprema", segundo a qual o atual pacto de estabilização orçamental não podia ser confrontado com o que se chama "as exigências jurídico-constitucionais".
Num argumento mais lato, e comparando as taxas de imposto que recaem sobre os rendimentos do trabalho e os outros, Canotilho manifesta "estranheza" pelo facto do OE evidenciar "maior tolerância para com os sujeitos passivos que não conseguem provar a proveniência dos rendimentos que os levam a mostrar sinais exteriores de riqueza, do que para com as pessoas que vivem ou viveram do trabalho".
"Não deixa de ser pertinente recordar que o fator trabalho se encontra intimamente ligado ao valor da dignidade humana", escreve, salientando que "não pode ser com ligeireza que são adotadas medidas legislativas que revestem especial severidade para quem trabalha ou trabalhou ao longo da sua vida (...) Em causa estão os valores mas profundos que informam a Lei Fundamental da República".
Parecer no Tribunal Constitucional
O parecer jurídico foi pedido pelo escritório de advogados UriaMenendez/Proença de Carvalho e entregue no final de Janeiro pelo Provedor de Justiça ao Tribunal Constitucional "para os efeitos tidos por convenientes".
O TC analisa presentemente os quatro pedidos de fiscalização do Orçamento de Estado em que a CES está em causa. Os pedidos, entregues pelo Presidente da República, o Provedor, um grupo de deputados do PS e outro do BE e PCP, foram reunidos num só processo de onde constam diversos pareceres.
Fonte: Expresso