Descida das Euribor expulsa famílias da “moratória” do crédito à habitação
A medida de fixação do crédito habitação cessa em dezembro para a maioria das famílias que aderiram a esta "moratória" há cerca de um ano, trazendo com isso um alívio imediato da prestação da casa.
A acentuada queda das taxas Euribor nos últimos meses está a provocar um efeito inesperado (mas positivo) para milhares de famílias que aderiram à medida de fixação temporária da prestação do crédito à habitação, promovida pelo então ministro das Finanças, Fernando Medina, no final de 2023.
Muitas das 8.636 famílias que entre novembro de 2023 e março de 2024 optaram por aderir a esta “moratória” para baixarem o peso da prestação da casa no orçamento familiar verão a medida suspensa já em dezembro, devido à atual conjuntura do mercado monetário.
Esta situação ocorre porque as taxas Euribor a 6 e 12 meses negoceiam atualmente abaixo da “taxa de juro protegida” associada a esta medida, que assumiu um valor equivalente a 70% da Euribor a 6 meses no momento da adesão. Na prática, isso significa que a taxa protegida da “moratória” do crédito à habitação ficou estabelecida entre 2,72% e 2,88%, dependendo do mês em que as famílias aderiram à medida.
Segundo o Decreto-Lei que regula as regras desta medida, a aplicação da fixação da prestação durante dois anos suspende-se imediatamente quando o indexante do contrato de crédito à habitação for inferior à taxa protegida. Esta cláusula, que inicialmente visava proteger as famílias de aumentos significativos nas taxas de juro, vai agora ser acionada devido à rápida descida das Euribor.
“De acordo com o regime previsto no artigo 7.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 91/2023, de 11 de outubro, conjugado com o n.º 1 do artigo 3.º do mesmo diploma, a aplicação da medida suspende-se 'de imediato' quando o indexante do contrato de crédito for inferior ao que resulta da aplicação de 70% da Euribor a 6 meses acrescido do spread previsto contratualmente”, esclarece o Banco de Portugal ao ECO.
As famílias que virem a medida suspensa beneficiarão, na prática, de prestações mais baixas do que teriam com a fixação. E caso as Euribor voltem a subir serão novamente “protegidos” pela medida de fixação da prestação de forma automática.
No entanto, é importante notar que nem todas as famílias que aderiram à medida serão afetadas simultaneamente. Aliás, nenhum empréstimo à habitação indexado à Euribor a 3 meses será ainda alvo de suspensão da medida em dezembro porque a taxa média da Euribor a 3 meses em novembro (que irá vigorar em dezembro nos contratos de crédito à habitação) deverá situar-se ainda acima dos 3%, sendo assim superior às taxas protegidas da “moratória”.
História diferente terão os contratos indexados à Euribor a 6 meses. Segundo cálculos do ECO, a taxa Euribor a 6 meses que será utilizada em dezembro para efeitos de crédito à habitação terá um valor médio de 2,8% — esta taxa é calculada pela média das taxas diárias da Euribor a 6 meses ao longo de novembro.
Considerando que a taxa protegida dos contratos que aderiram à medida de fixação da prestação em novembro e dezembro do ano passado é de 2,88% e 2,85%, respetivamente, todos os contratos indexados à Euribor a 6 meses que aderiram à medida nos dois últimos meses de 2023 serão retirados do quadro da medida de apoio e passarão para os moldes inicialmente contratados aquando da compra de casa. De fora mantêm-se ainda as famílias que aderiram à medida de fixação da prestação nos meses de janeiro, fevereiro e março porque as taxas protegidas nessa altura correspondiam a 2,75%, 2,72% e 2,73%, respetivamente.
Fim de linha da fixação da prestação da casa
A medida de fixação temporária da prestação do crédito à habitação cessará em dezembro para os empréstimos indexados à Euribor a 6 meses que aderiram à "moratória" em novembro e dezembro de 2023, porque a Euribor a 6 meses já está abaixo das taxas protegidas fixadas nessa altura. Fora já do âmbito da medida continuam os contratos indexados à Euribor a 12 meses, por o indexante manter-se abaixo das "taxas protegidas", enquanto os empréstimos indexados à Euribor a 3 meses mantém-se, para já, ao abrigo da "moratória", por a Euribor a 3 meses permanecer acima das taxas fixadas pela medida.
Efeito da suspensão da “moratória” e da bonificação dos juros
Dezembro marcará o primeiro mês de suspensão da medida de apoio às famílias que têm empréstimos indexados à Euribor a 6 meses por, pela primeira vez, a taxa situar-se abaixo das taxas protegidas estabelecidas nos dois primeiros meses em que a medida foi disponibilizada.
Porém, no caso dos contratos indexados à Euribor a 12 meses, esta situação não se colocará porque em outubro a taxa média da Euribor a 12 meses foi de 2,69%, suspendendo em novembro a totalidade destes contratos que tinham aderido à medida de fixação da prestação do crédito à habitação.
Para os créditos à habitação indexados à Euribor a 12 meses, dezembro será assim apenas a confirmação da suspensão da medida, dado que a taxa média da Euribor a 12 meses em novembro a vigorar em dezembro deverá ser de 2,51%.
A medida de fixação da prestação foi sempre concebida como uma solução temporária para um período de subida nas taxas de juro. O seu objetivo principal era proporcionar um “porto seguro” para as famílias durante um período de incerteza económica.
É importante destacar que, apesar da suspensão imediata para muitos contratos, a medida de fixação da prestação poderá ser retomada automaticamente se o valor do indexante do contrato de crédito voltar a superar a taxa protegida inicialmente contratada até completar dois anos desde o início da adesão à “moratória”. Isso significa que as famílias não perdem definitivamente o benefício da “moratória”, mas entram numa espécie de “modo de espera” enquanto as taxas de mercado permanecerem baixas.
Também associado à queda das Euribor, a medida de bonificação dos juros sobre o crédito à habitação, inserida no âmbito do programa Mais Habitação, promovido pelo anterior Governo, deverá cair para a maioria dos contratos.
Esta a bonificação incide sobre a diferença entre o indexante do contrato e o limiar de 3%, passando a ser de “100 % do valor apurado quando o mutuário apresente uma taxa de esforço igual ou superior a 50% e de 75% do valor apurado quando o mutuário apresente uma taxa de esforço igual ou superior a 35% e inferior a 50%, independentemente do escalão de IRS em que se enquadrem, desde que até ao limite do sexto escalão”, refere o Decreto-Lei que regula esta medida. Como tanto a Euribor a 6 meses e 12 meses já se encontram abaixo deste nível, e a Euribor a 3 meses aproxima-se rapidamente, esfuma-se também esta medida de apoio às famílias com crédito à habitação.
Tal como a medida de fixação temporária da prestação da casa, também a bonificação dos juros foi uma medida criada para aliviar os encargos financeiros de famílias com créditos à habitação com taxa variável. Desde a sua implementação, este apoio beneficiou mais de 20 mil famílias, tendo, no entanto, ficado muito aquém dos 200 mil contratos elegíveis.
A suspensão destas duas medidas terá impactos variados para as famílias afetadas. Por um lado, significa que as prestações do seu crédito à habitação irão diminuir, refletindo as taxas de juro mais baixas do mercado no presente, representando com isso um alívio imediato no orçamento familiar para muitos portugueses.
Por outro lado, a suspensão da medida reintroduz um elemento de incerteza na gestão financeira das famílias. A estabilidade oferecida pela fixação da prestação, que permitia um planeamento financeiro mais previsível, é temporariamente removida. As famílias voltam a estar expostas às flutuações do mercado, o que pode gerar ansiedade, considerando especialmente a volatilidade económica dos últimos anos.
Quanto custa a moratória na carteira das famílias?
Embora a suspensão da medida possa parecer uma má notícia à primeira vista, é importante contextualizar que ela ocorre num cenário de taxas de juro mais favoráveis para os consumidores. As famílias que virem a medida suspensa beneficiarão, na prática, de prestações mais baixas do que teriam com a fixação. E caso as Euribor voltem a subir serão novamente “protegidos” pela medida de fixação da prestação de forma automática.
Porém, Natália Nunes, coordenadora do gabinete de proteção financeira da DECO, refere que “as prestações continuam muito elevadas face ao que era em 2022″, notando também que “ainda há famílias com algum estrangulamento” financeiro.
É importante lembrar que a medida de fixação da prestação foi sempre concebida como uma solução temporária para um período de subida nas taxas de juro. O seu objetivo principal era proporcionar um “porto seguro” para as famílias durante um período de incerteza económica. O facto de estar a ser suspensa devido a taxas mais baixas é, em certa medida, um sinal positivo para a economia e particularmente para a carteira das famílias.
Fonte: Eco