Banqueiros do BESI indiciados por crime de abuso de informação privilegiada
Administradores do Banco Espírito Santo Investimento terão usado informação confidencial na compra de acções da EDP e da REN
O Departamento Central de Investigação e Penal (DCIAP) está a investigar indícios da prática do crime de abuso de informação privilegiada por parte de alguns administradores do Banco Espírito Santo Investimento (BESI) nos processos da 8.ª fase de privatização da EDP e da 2.ª fase de privatização da REN, ocorridos no final de 2011 e no início de 2012. O procurador-geral adjunto Rosário Teixeira, responsável pela investigação do DCIAP, entende que existem indícios de que alguns banqueiros do BESI, instituição de que é chairman Ricardo Salgado, realizaram operações de aquisição de acções das empresas a privatizar (EDP e REN) nos dias anteriores à decisão do governo de adjudicar a venda de 21,35% do capital social da EDP e 25% das acções representativas do capital social da Rede Eléctrica Nacional (REN) às empresas China Three Gorges e State Grid.
Essas operações, ao que apurou o i junto de fontes judiciais, terão sido realizadas através de sociedades offshore (empresas sedeadas em paraísos fiscais) disponibilizadas pela sociedade financeira Akoya Asset Managment, liderada pelos suíços Michel Canals e Nicolas Figueiredo.
A compra das acções por parte de tais sociedades offshore foi financiada com fundos transferidos de Portugal para o exterior pelos banqueiros indiciados. Estas movimentações foram detectadas pela equipa liderada pelo procurador Rosário Teixeira nos primeiros momentos da operação Monte Branco quando detectou movimentações suspeitas nas contas suíças disponibilizadas pela Akoya aos seus clientes – entre os quais se contavam os administradores do BESI.
A aquisição de tais acções estaria vedada aos administradores BESI envolvidos, pois o banco de investimento esteve envolvido nos processos de privatização da EDP e da REN desde o início. Logo em Junho de 2011, o BESI, juntamente com o Caixa Banco Investimento (BI) e o Millenium Investment Bank, foi contratado pela Parpública (empresa pública que formalmente é a vendedora das acções das empresas a privatizar) para a execução das avaliações económico-financeiras da EDP e da REN. No âmbito dessa avaliação, que serviu para o Estado ter uma ideia do valor das acções que pretendia alienar e que foi concluída dois meses depois, o BESI teve acesso a informação interna e confidencial da eléctrica nacional.
Apesar do BESI ter mostrado interesse em assessorar o Estado durante o processo de privatização daquelas companhias, o governo optou por mandatar a Caixa BI a contratar a norte-americana Perella Weinberg Partners. Assim, o banco de investimento do Grupo Espírito Santo posicionou-se para angariar um cliente privado interessado em concorrer às privatizações da EDP e da REN. Após obter uma release letter da Parpública (carta que liberta o destinatário, no caso o BESI, de determinadas obrigações contratuais), o BESI chegou a acordo com os chineses da China Three Gorges e, através destes, aos da State Grid para assessorá-los no processo de privatização. Foi durante este processo, e quando o BESI teve acesso a mais informação confidencial sobre a EDP e a REN, que alguns banqueiros do BESI compraram acções daquelas sociedades cotadas em bolsa.
O facto dos fundos utilizados para a compra dos títulos mobiliários nunca terem sido declarados ao fisco pelos respectivos administradores do BESI, faz com que o DCIAP entenda que também existem suspeitas de fraude fiscal e de branqueamento de capitais por parte dos mesmos gestores.
A investigação do DCIAP às privatizações da EDP e da REN está também concentrada em perceber por que razão os chineses baixaram as suas propostas da 1.ª fase (onde as propostas são meramente indicativas) para a fase final (onde todas as propostas são vinculativas).
No caso da EDP, e segundo indícios recolhidos pelos investigadores, o BESI terá apresentado um primeiro parecer à China Three Gorges que apontava para um preço que variava entre os 3,5 euros e os 3,75 euros por acção, cujo ponto médio era de 3,625 euros. Contudo, a proposta final da CTG acabou por ser de 3,45 euros por acção. Esta poupança de 17,5 cêntimos poderá ter levado a uma poupança de mais de 117 milhões de euros por parte da CTG – valor que, segundo o DCIAP, quantifica igualmente a perda patrimonial do Estado, como a revista “Sábado” já noticiou.
Já no caso da REN, a State Grid também baixou a proposta de 3 euros para 2,90. Esta descida de 10 cêntimos, terá levado a uma poupança de cerca de 13,3 milhões de euros para os chineses.
A equipa do procurador Rosário Teixeira está convicta de que existem indícios que apontam para uma intervenção do BESI que possibilitou à CTG e à State Grid saberem as propostas dos outros concorrentes. O DCIAP entende mesmo, ao que o i apurou, que José Maria Ricciardi, presidente executivo do BESI, e Paulo Lameiras Martins, administrador executivo do BESI com o pelouro dos serviços financeiros e das médias empresas, terão desenvolvido acções para terem acesso aos critérios sigilosos de apreciação das propostas por parte da Parpública e às propostas dos outros concorrentes. Este acesso ilegítimo terá permitido à CTG oferecer um preço por acção apenas no montante necessário para superar as ofertas dos outros concorrentes (a alemã EON e os brasileiros Electrobrás e CEMIG).
O DCIAP quer perceber de onde terá partido a fuga de informação na posse dos assessores financeiros da Parpública (a Caixa BI e a Perella) e dos altos funcionários da Parpública.
Apesar do i não ter recebido respostas às perguntas que colocou ao BESI e a José Maria Ricciardi no passado dia 22 de Novembro, estes indícios são totalmente refutados pelos administradores do BESI, ao que o i apurou junto de fontes próximas de Riccardi.
Fonte: Jornal i