Madeira vai pedir fiscalização da constitucionalidade da Lei das Finanças Locais
Deputados do PSD-Madeira já tinham votado contra, e agora é o presidente do governo madeirense a falar de “violação grosseira” da Constituição e da autonomia regional.
Primeiro, os deputados do PSD-Madeira em São Bento votaram contra. Agora, é o Governo do arquipélago que se prepara para levar a Lei das Finanças Locais, aprovada na semana passada no Parlamento, ao Tribunal Constitucional.
Em causa, tem repetido nos últimos dias Miguel Albuquerque, estão as normas do diploma que afectam receitas regionais às autarquias locais. O Funchal considera tal facto “inadmissível”, uma “violação grosseira” da autonomia regional. “O Estado Português não tem, no âmbito da Constituição e do Estatuto Político-Administrativo, a possibilidade de utilizar ou arrecadar receitas da Madeira sem a anuência democrática dos eleitos madeirenses”, protestou, de imediato, o presidente do executivo madeirense.
Nos dias seguintes, o discurso foi endurecendo. “É uma violação grosseira dos poderes autonómicos, afectando receitas da região a situações das autarquias locais e violando mais uma vez o Estatuto e a Constituição”, disse esta segunda-feira, depois de garantir que o governo regional vai “requerer a inconstitucionalidade dessas normas”.
A posição madeirense já tinha ficado vincada quando do diploma foi votado na Assembleia da República, no dia 18. Sara Madrugada da Costa, Rubina Berardo e Paulo Neves, do PSD-Madeira, votaram contra a proposta de lei, em desacordo com a restante bancada.
“Não é aceitável que a receita do IVA seja retirada à região para ser entregue às autarquias locais para financiar despesas que devem ser assumidas pelo Orçamento do Estado”, justificou na altura Sara Madruga da Costa, acrescentando que os social-democratas madeirenses não aceitam que as verbas atribuídas aos municípios do arquipélago, por via do IRS, prejudiquem as receitas próprias da região.
O Governo, continuou a deputada madeirense, pretende interferir na autonomia madeirense, apropriando-se de receitas que são próprias da Madeira. “Não podemos aceitar esta interferência na nossa autonomia naquela que é uma das mais importantes conquistas da nossa democracia”, insistiu.
Na declaração de voto conjunta, os deputados madeirenses já avisavam que o diploma poderia ser enviado para o Palácio Raton , por estar “fatalmente” ferido de inconstitucionalidade. “Procede a uma apropriação ilegal de receitas próprias das Regiões Autónomas, infringindo a lei das Finanças Regionais, o Estatuto Político-Administrativo e a Constituição da República Portuguesa.”
À luz do Estatuto Político-Administrativo da Madeira, as receitas de impostos cobradas na Madeira são pertença da região autónoma e integram o orçamento regional.
Sara Madruga da Costa assenta aí os argumentos para acusar o executivo socialista de desrespeitar a autonomia madeirense. Primeiro, apontou ao PÚBLICO, não ouviu os órgãos próprios da região – governo e assembleia regional – como prevê a Constituição sempre que está em causa matéria das regiões autónomas; depois, quando pediu um parecer, e ele foi negativo, não teve isso em conta.
Na Madeira, o caso ganhou dimensão política com o PSD a somar esta matéria a outras questões pendentes com Lisboa, como a revisão das taxas de juro ou o desbloqueamento de 30,5 milhões de euros para a reconstrução pós-incêndios 2016. “A autonomia da Madeira está sob ataque, está sob pressão, está sob cerco”, acusou, já esta semana, Miguel Albuquerque.
Os socialistas madeirenses discordam. No final de um encontro com o presidente da Câmara de Machico, o socialista Ricardo Franco, Victor Freitas devolveu as críticas dizendo que o diploma “não belisca” a autonomia regional. Ao parlamento regional, disse o líder do grupo parlamentar do PS na assembleia madeirense, cabe a responsabilidade de adaptar a nova legislação à Madeira. “Quer a descentralização de Lisboa para a região, mas depois centraliza tudo na Quinta Vigia [sede da presidência do governo regional] e não descentraliza para os municípios”, disse Victor Freitas, apontando para Albuquerque.
A Lei das Finanças Locais foi aprovada com os votos favoráveis do PS e do PSD e com os votos contra de CDS-PP, PCP, PEV, BE e PAN. Além dos três parlamentares do PSD-Madeira, o socialista Paulo Trigo Pereira também votou contra, e a colega de bancada Helena Roseta absteve-se.
Fonte: Público