Extinção do SEF acabou com controlo criminal aos vistos em países de risco
Índia, Guiné-Bissau e China estão entre os países com grande fluxo migratório para Portugal, mas não há triagem de segurança especializada aos pedidos de visto nas representações diplomáticas.
Com a extinção do SEF os lugares dos designados “oficiais de ligação para a imigração” nas embaixadas portuguesas em países de origem dos principais fluxos migratórios para o nosso país deixaram de ser ocupados por inspetores desta antiga polícia de estrangeiros especializada em redes criminosas de auxílio à imigração ilegal.
Esses postos passaram a ser nomeados pela nova Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) escolhidos de entre os seus funcionários da carreira administrativa, sem qualquer competência de investigação criminal.
Angola, Brasil, Cabo Verde, China, Espanha /Marrocos, Guiné-Bissau, Índia e Reino Unido foram selecionados, num despacho de 2019 assinado pelos ministros dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, das Finanças, Mário Centeno, e da Administração Interna, Eduardo Cabrita, como países cujos fluxos migratórios exigiam a presença especializada policial na análise de pedidos de visto.
Era então considerado que “que a colocação de oficiais de ligação de imigração nas missões diplomáticas portuguesas nos países de origem dos maiores fluxos migratórios para Portugal, se traduz desde logo numa maior proximidade com vista a introdução de fluxos de imigração regular e ordenada e no tratamento mais célere de vistos de acordo com a legislação portuguesa, a par de se constituir como um instrumento eficaz de combate à imigração ilegal, dificultando a ação das redes organizadas que a fomentam e exploram”.
Neste momento, porém, países como a Índia e a Guiné-Bissau, sinalizados pelas autoridades como risco de origem de fluxos de imigração ilegal, não têm qualquer oficial de ligação nem está a ser feita nesses locais triagem de prevenção contra as redes de auxílio à imigração ilegal.
No caso da Índia, cuja embaixada portuguesa tem também jurisdição sobre o Bangladesh e o Nepal, o último oficial de ligação de imigração do SEF deixou Nova Deli no início do ano, quando terminou a sua comissão de serviço.
Ao contrário de outras embaixadas europeias como a da Alemanha que tem uma equipa de investigação criminal própria constituída para esta triagem, Portugal não tem um único polícia.
A comunidade indiana é a 4ª maior do nosso país, com 35 416 residentes oficiais (dados de 2022 do Relatório Anual de Imigração e Asilo- RIFA), sendo o grupo de estrangeiros que mais tem crescido e passou a figurar no “top ten” de nacionalidades mais representativas.
De acordo com os dados estatísticos ainda disponíveis do SEF, nos últimos cinco anos o número de títulos de residência concedidos a cidadãos indiana aumentaram 210% (de 11 393 em 2017 para 35 416 em 2022); os do Bangladesh subiram 209% ( de 5 325 para 16 468); e os do Nepal cresceram 107% (de 11 489 para 23 839).
No caso da Guiné-Bissau, o aumento neste período de tempo foi de 46% (de 16 186 para 23 737) e fazendo parte da Comunidade de Países de Língua Oficial Portuguesa (CPLP) a representação diplomática aportuguesa pode ainda vir a ter um reforço de peritos analistas de vistos do ministério dos Negócios Estrangeiros, conforme consta no Plano de Ação para as Migrações anunciado na segunda-feira pelo Governo.
“Reforço da capacidade de resposta e processamento dos Postos Consulares identificados como prioritários, considerando, designadamente, os fluxos migratórios sazonais, os objetivos estratégicos de atração de trabalhadores e a adequada implementação do Acordo de Mobilidade CPLP” é um dos objetivos definidos neste Plano.
Da lista de 2019 já referida, neste momento só o Brasil e Espanha /Marrocos ainda têm oficiais de ligação do ex-SEF, mas estão a terminar as suas comissões de serviço.
No caso do Brasil, onde o consulado de S. Paulo está a ser investigado por suspeitas de infiltraçao de organizações criminosas, será no fim do ano.
A China, com cerca de 22 000 nacionais com visto de residência em 2022 (desceu 13%) também não tem oficial de ligação em Pequim com esta especialidade.
No Reino Unido está um oficial de ligação para a imigração que não é da carreira de investigação criminal: conforme o DN noticiou na altura, trata-se de uma técnica superior que era assessora no gabinete da então Ministra Adjunta, Ana Catarina Mendes - responsável pelo processo de criação AIMA - e foi nomeada em junho de 2023 ainda antes da extinção do SEF, que se concretizou em outubro.
Nessa altura, a lei em vigor ainda exigia que os oficiais de ligação deviam ser nomeados “de entre funcionários de investigação e fiscalização do SEF, oficiais da GNR ou oficiais de polícia da PSP”.
No diploma que cria a AIMA a prerrogativa para nomear os oficiais de ligação para a imigração passou a ser “sob proposta do membro do Governo responsável pela área das migrações” e os potenciais selecionados para o cargo serão “funcionários da AIMA, que para eles sejam designados ou a eles se candidatem”.
O conteúdo funcional para estes oficiais de ligação da AIMA não foi ainda publicado, embora tendo a Agência apenas funções administrativas está vedada qualquer competência de investigação ou securitária aos seus funcionários nomeados.
Os oficiais de ligação do SEF tinham, por regra, como missões (além de outras específicas, de acordo com o país), “cooperar com as entidades nacionais e anfitriãs; garantir a regulação do fluxo migratório; prevenir a entrada de emigrantes em situação ilegal; garantir o combate à imigração ilegal; e possibilitar o tratamento mais célere de vistos concedidos de acordo com a legislação portuguesa ou ao abrigo de acordos de imigração temporária”.
Fonte: Diário de Notícias