Ambiente. Jovens que processaram Portugal estão “nervosos, mas confiantes”
Desde 2017 que o caso contra Portugal e os outros 31 países está a ser construído. Decisão positiva do TEDH, no dia 9, pode ser argumento para outros processos.
Em 2020 seis jovens portugueses apresentaram ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH) uma ação contra 32 países europeus, incluindo Portugal, acusando-os de não estarem a fazer o suficiente para cumprir com as suas obrigações para minimizar os impactos das alterações climáticas. Na próxima semana, no dia 9 de abril, vão saber o veredicto do tribunal.
“Estou aliviada mas nervosa quanto à decisão do tribunal. Tinha 12 anos quando começámos a construir o caso por isso já estamos nisto há vários anos”, afirmou esta quarta-feira Sofia Oliveira, agora com 19 anos, esta quarta-feira numa conferência de imprensa online.
“Independentemente da decisão, já atingimos muito ao processar estes 32 países e a verdade é que eles não têm defesa”, frisou, por outro lado, Catarina Mota, de 23 anos e uma dos seis jovens envolvidos neste caso.
Em setembro do ano passado o caso foi apresentado no Tribunal Pleno (Grand Chamber) do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, depois de quatro anos de preparação e três de troca de argumentos escritos entre os jovens e os países acusados. O caso recebeu a qualidade de prioritário pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos por se tratar de “uma questão séria” à luz da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
O processo foi inicialmente instaurado contra 33 países, abrangendo os 27 estados-membros da União Europeia (UE), incluindo Portugal, Noruega, Rússia, Suíça, Turquia, Reino Unido e Ucrânia. Com o início da guerra na Ucrânia, os jovens decidiram retirar a sua queixa contra este país. Gerry Listan, advogado da Global Legal Action (GLAN), uma organização jurídica sem fins lucrativos que trabalha na área dos direitos humanos, e que apoiou os jovens em todo este processo, explicou que a acusação envolveu vários países para garantir que as pessoas em sítios mais frágeis também sejam abrangidas pela decisão do tribunal.
Na acusação os jovens afirmaram que os incêndios florestais que aconteceram em Portugal em 2017 são resultado direto das alterações climáticas. Alegaram ainda que as ondas de calor provocadas pelas alterações climáticas têm afetado a sua possibilidade de passar tempo ao ar livre, fazer exercício, dormir e concentrar-se adequadamente. Finalmente realçam que sentem ansiedade climática por todas as catástrofes naturais que afetam o país e pela perspetiva de passarem o resto da vida num ambiente cada vez mais quente que os afeta a eles e qualquer família que venham a constituir.
André Oliveira lembrou os incêndios de 2017 e como a situação climática se tem vindo a deteriorar desde aí. “Todos os meses têm sido os mais quentes de sempre. Portugal não está a fazer o suficiente e assusta-me pensar no que vai acontecer nos próximos anos”.
Na troca de argumentos, todos os países acusados insistiram na inadmissibilidade do caso, com Portugal a classificar alguns dos argumentos apresentados como sendo “meras suposições ou hipóteses vazias”.
“Os países focaram os seus argumentos apenas na inadmissibilidade do caso e nunca responderam às perguntas sobre se estão a fazer o suficiente para combater as alterações climáticas. Foram argumentos apenas para evitar que as suas políticas climáticas sejam analisadas”, afirmou Gerry Listan.
Além do caso Duarte Agostinho e Outros v. Portugal e 31 outros Estados, o TEDH vai tomar uma decisão sobre dois outros casos climáticos: a a Associação de Mulheres Seniores para a Proteção do Clima e Outros v. Suíça, e Carême v. França. Nos três casos, os queixosos acusam os países de estarem a falhar em proteger os seus direitos humanos, com os jovens portugueses a irem mais longe ao defenderem que estes países devem obrigar as empresas, como os gigantes dos combustíveis fósseis e os grandes bancos, a reduzir rapidamente as suas contribuições para as emissões globais. O caso destes jovens é o maior dos três.
Caso vençam o processo, todas as decisões do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos são legalmente vinculativas e, por isso, esta decisão pode resultar num tratado regional juridicamente vinculativo que obrigará os países acusados a acelerar a sua ação climática, nomeadamente através da adoção de objetivos mais ambiciosos em matéria de emissões na legislação nacional e de contribuições determinadas a nível nacional que apresentam no âmbito do Acordo de Paris.
Uma decisão a favor dos jovens pode contribuir para que futuros casos climáticos a nível nacional por toda a Europa tenham uma base mais forte para argumentar os seus casos.
“Seja qual for o resultado não vamos parar para garantir o nosso futuro. Depois de dia 9 vamos descansar e pensar nos próximos passos”, afirmou André Oliveira.
Fonte: Diário de Notícias
Foto: Carlos Costa/AFP