Marcelo dissolve o Parlamento e convoca eleições para 10 de março
O presidente da República anunciou, esta quinta-feira à noite, a decisão de dissolver a Assembleia da República e antecipar as eleições legislativas para 10 de março, depois de ter estado reunido com os conselheiros de Estado, que não chegaram a consenso.
"Portugueses, chamado a decidir sobre o cenário criado pela demissão do Governo, consequência da exoneração do primeiro-ministro, optei pela dissolução da Assembleia da República e a marcação de eleições em 10 de março de 2024", declarou Marcelo Rebelo de Sousa, depois de ter ouvido, ontem, os partidos com assento parlamentar e, hoje, o Conselho de Estado - "os primeiros claramente favoráveis, o segundo com um empate e, portanto, uma posição não favorável" à decisão.
"Fi-lo por decisão própria e por inúmeras razões", continuou, justificando-se com "a natureza do voto" das últimas eleições, "personalizado no primeiro-ministro", com a "fraqueza" de um Governo com a mesma maioria mas outro líder e com o "risco de essa fraqueza redundar num mero adiamento da dissolução, num pior momento e com desfecho mais imprevisível", vivendo o Executivo até lá como "Governo presidencial" e o presidente como "inspirador partidário".
Aprovação do Orçamento garantida
Outro dos argumentos para a decisão presidencial - que é também uma salvaguarda para o país - é a da "garantia da indispensável estabilidade económica e social que é dada pela prévia votação do Orçamento do Estado para 2024", antes de ser formalizada a exoneração do primeiro-ministo, no início de dezembro. “A aprovação do Orçamento permitirá ir ao encontro das expectativas de muitos portugueses e acompanhar a execução do PRR [Plano de Recuperação e Resiliência] que não pára nem pode parar, com a passagem do Governo a Governo de gestão ou mais tarde com a dissolução da Assembleia da República”, defendeu.
Na última razão invocada, Marcelo realçou a importância de devolver "a palavra ao povo, sem dramatizações nem temores". "É essa a força da democracia: não ter medo do povo", asseverou o presidente da Républica, que, assegurou, "tentou encurtar o mais possível o tempo" das decisões anunciadas, justificando a data das eleições - 10 de março - com a necessidade de dar tempo ao PS de se reorganizar internamente.
Dirigindo-se aos portugueses no final da intervenção, numa mensagem de esperança e confiança na democracia, Marcelo apelou para que olhem “em frente” e escolham um "Governo que procure assegurar a estabilidade e o progresso económico, social e cultural em liberdade, pluralismo e democracia, com visão de futuro, tomando o já feito, acabando o que importa fazer e inovando no que ficou por alcançar". “Confio em vós, portugueses, no vosso patriotismo, no vosso espírito democrático, na vossa experiência, no vosso bom senso, na vossa liberdade. Como sempre, sois vós, só vós, a certeza decisiva do nosso Portugal”, concluiu.
Sublinha "elevação do gesto" de Costa
Antes do anúncio aguardado, o chefe de Estado contextualizou o momento da saída de António Costa - que apresentou a demissão na sequência de uma investigação judicial em curso - e deixou-lhe alguns elogios, realçando-lhe a "elevação do gesto", a "respetiva comunicação aos portugueses" e a disponibilidade manifestada para se manter no cargo de primeiro-ministro até à sua substituição. Destacou-lhe o "serviço à causa pública", particularmente em "longos e exigentíssemos anos", marcados pela saída de um défice excessivo, pelo saneamento da banca, por uma pandemia e por duas guerras.
Pelo meio, um apelo à Justiça: "Espero que o tempo, mais depressa do que devagar, permita esclarecer o sucedido, do respeito da presunção da inocência, da salvaguarda do bom nome, da afirmação da Justiça e do reforço do Estado de Direito democrático."
Nota de imprensa da PGR motivou demissão
O atual impasse político acontece depois de o primeiro-ministro ter anunciado a sua demissão na terça-feira, na sequência de buscas em vários gabinetes do Governo, no âmbito de uma investigação do Ministério Público em torno dos negócios do lítio e hidrogénio verde, que levou à detenção do seu chefe de gabinete, e de uma nota do gabinete de imprensa da Procuradoria-Geral da República (PGR) que implicava, de forma pouco clara, o nome de António Costa.
Em declarações aos jornalistas, em São Bento, o chefe de Governo demissionário justificou a saída com a incompatibilidade entre o cargo de primeiro-ministro e quaisquer suspeições criminais, declarando-se de "consciência tranquila" e inocente da "prática de qualquer ato ilícito ou sequer censurável".
"Confio totalmente na Justiça e no seu funcionamento. É, porém, meu entendimento que a dignidade das funções de primeiro-ministro não é compatível com qualquer suspeição com a sua integridade, conduta ou suspeita de qualquer prática criminal. Obviamente, apresentei a demissão ao presidente da República", disse, na altura.
Fonte: Jornal de Notícias
Foto: Carlos M. Almeida/Lusa