Inspetores do SEF vão ter formação de dois meses para iniciar adaptação à PJ
Com o país em prevenção de atentados terroristas, como o facto de o alerta de ameaça ter passado de elevado para o grau de "significativo", os dirigentes das polícias entram esta semana em contrarrelógio para preparar o "Dia D", 29 de outubro, da extinção do SEF. Quando falta uma semana, muitas dúvidas prevalecem e também algumas surpresas. Além dos 404 inspetores que vai emprestar à GNR e à PSP, a PJ terá ainda de subtrair mais de 200 aos 385 que deveriam assumir ali funções.
Os inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) que a partir do próximo dia 29 - data marcada para a extinção do SEF - vão assumir já funções na Polícia Judiciária (PJ) terão uma formação de cerca de dois meses para se adaptarem e conhecerem a sua nova "casa". Esta formação será depois complementada em funções, com acompanhamento por inspetores sénior da PJ durante a sua integração nas brigadas.
De acordo com fonte oficial da PJ, "o plano do curso está feito e contará com formadores de topo". As ações formativas "serão descentralizadas por todo o país e em Lisboa, que recebe a maior parte dos inspetores, e serão realizadas na sede", foi antecipado ao DN em resposta a questões colocadas.
Da parte do Sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização (SCIF), que representa a maior parte destes inspetores, é bem-vinda esta iniciativa.
"Não temos quaisquer reservas quanto a isso e até nos parece um primeiro passo essencial a uma boa integração. A Polícia Judiciária é uma instituição com a sua própria cultura organizacional, à qual teremos que nos adaptar. Como polícia, abrange áreas criminais muito especializadas nas quais o SEF não opera, e, portanto, não é senão natural que os elementos do SEF recebam a adequada formação, por forma a serem plenamente integrados na sua nova casa", sublinha o presidente do SCIF, Rui Paiva.
De resto, assevera, "desde sempre os inspetores - e nós enquanto sindicato que os representa - reivindicaram por muita e adequada formação em todas as áreas da sua atividade, por forma a manter os elevados padrões a que vêm habituando o país. Para nós, esta transição não pode ser exceção, e importa capacitar os ainda inspetores do SEF para exercerem com os elevados níveis de desempenho que deles se espera a sua nova missão. No contexto atual, consideramos que essa formação só ajudará à rápida e plena inserção dos elementos do SEF na PJ. Incompreensível seria, de todo, é que não existisse nenhuma formação".
AIMA com 10 inspetores
Rui Paiva é um dos inspetores do SEF que já está instalado na sede da PJ, juntamente com cerca de duas dezenas de outros camaradas, embora ainda com a dependência funcional do SEF. "Está a correr muito bem. Não há problemas. Estamos tranquilos. Tomara que todos fossem para lá. Falta limar umas arestas, mas daqui a dois, três meses, estará tudo operacional", afiança.
Mas a nota positiva à PJ é das poucas que tem para dar em relação a todo o processo de extinção do SEF, que tem acompanhado muito de perto.
Se na semana passada o tinha classificado de "uma gigantesca operação de cosmética", porque todos os inspetores das fronteiras ali iriam permanecer, juntamente com a GNR e a PSP, que a partir de dia 29 assumem o comando, quando faltam apenas oito dias para a transferência das competências do SEF para sete entidades diferentes, ainda restam muitas dúvidas quanto a esta reorganização do sistema de segurança nas fronteiras, anunciado há três anos pelo então ministro da Administração Interna Eduardo Cabrita, aprovada na Assembleia da República em novembro de 2021 e adiada já duas vezes.
Por exemplo, em relação à distribuição dos inspetores por cada um dos referidos sete organismos ainda ninguém assume todos os números, com exceção do gabinete da ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, que avoca "um máximo de 10 inspetores, que serão colocados temporariamente, em regime de afetação funcional transitória pelo período máximo de um ano", para a nova Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA).
Fonte oficial deste gabinete disse ainda que "os serviços da AIMA vão funcionar de forma dispersa por todo o território nacional, mas a AIMA irá reforçar a sua presença no território com instalação de lojas AIMA, preferencialmente dentro de Lojas do Cidadão, estando prevista a instalação de várias lojas já em 2024 e com o apoio das autarquias", e ainda que "está prevista a realização urgente de um grande investimento em tecnologia e num novo modelo de atendimento, de modo a garantir que é prestado um melhor serviço aos cidadãos migrantes".
Inspetores a subtrair à PJ
O gabinete do ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, por seu lado, limita-se a afirmar que "dos 789 profissionais da Carreira de Investigação e Fiscalização (CIF) que passam para o quadro de pessoal da PJ, 404 ficam em afetação funcional transitória nas forças de segurança: 324 junto da PSP e 80 junto da GNR", e que "numa fase posterior será definido o número de elementos que ficarão em afetação funcional temporária junto de outros serviços".
Questionado sobre quando seria essa "fase posterior", fonte oficial respondeu que seria "depois de dia 29". Acrescentou ainda que os 404 inspetores "vão manter-se junto à PSP e à GNR pelo menos um ano, para garantir a tranquilidade e segurança no processo de transição de competências no controlo das fronteiras marítimas e aéreas".
Da parte da PJ não foi respondida a questão sobre o número concreto de inspetores que no próximo dia 29 ali se vão apresentar. Mas o DN fez algumas contas e concluiu que a PJ deverá receber bastante menos inspetores do que, possivelmente, contava, uma vez que nestes últimos dias vão tomando conhecimento de colocações que não tinham sido suscitadas.
Desta forma, partindo do número dado pelo MAI de 789 inspetores que oficialmente vão integrar os seus quadros e subtraindo os 404 inspetores que ficam nas fronteiras com a GNR e a PSP, sobram 385.
Destes 385 terá ainda menos 68, que passam à disponibilidade; menos um mínimo de 50 que vão integrar a nova Unidade de Coordenação de Fronteiras e Estrangeiros (UCFE), o "mini-SEF" que vai funcionar no Sistema de Segurança Interna (SSI); um mínimo de 20 para os Centros de Cooperação Policial e Aduaneira (CCPA); menos os 30 coordenadores e coordenadores superiores para a Autoridade Tributária e Aduaneira; menos os 70 inspetores que estão em várias missões internacionais, a maior parte na Frontex, e os 10 da AIMA.
Subtraindo estes 248 aos 385 que não estão na PSP e GNR, sobram 137.
PSP: 400 polícias formados
"A UCFE será dotada com os recursos humanos tidos por adequados, nomeados em regime de comissão de serviço por tempo determinado, para o exercício de funções específicas de coordenação em matéria de fronteiras e estrangeiros e nas áreas de apoio (informática, jurídica, administrativa e tradução, entre outras)", declara o fonte oficial do SSI, embora sem precisar números.
De acordo com a legislação já publicada, seriam 15, mas o "mini-SEF" terá responsabilidades acrescidas em toda a coordenação de todas as entidades e bases de dados, tendo sido necessário aumentar o recrutamento.
"A atividade da UCFE sucede, em parte, àquilo que é atualmente a atividade do SEF, que, deixando de existir enquanto entidade no dia 29 de outubro, dá lugar a uma nova entidade, com um conjunto de recursos humanos, financeiros e materiais já existentes. Este mecanismo pretende, no fundo, evitar quaisquer hiatos, constrangimentos ou disrupções decorrentes de situações não acauteladas ou mal planeadas", garante.
Por seu turno, a Direção Nacional da PSP, liderada por José Barros Correia, garante que "até ao próximo dia 28 a PSP terá 400 polícias habilitados a exercer funções de controlo nas nove fronteiras aéreas. Destes, 62 estão igualmente habilitados a executar missões de escoltas aéreas".
A PSP assegura que, tal como está previsto na legislação, "a plena assunção de responsabilidades da PSP em matéria de controlo fronteiriço ocorrerá em outubro de 2025", admitindo que "em alguns aeroportos exista a possibilidade de antecipação do período de afetação transitória legalmente previsto".
No entanto, apesar do número elevado de polícias formados, a PSP não consegue garantir a 2ª e a 3ª linha do controlo nos aeroportos, que exigem treino mais qualificado.
"A afetação de polícias para as 2.ª e 3.ª linhas depende de dois fatores fundamentais: experiência efetiva na 1.ª linha e apetência profissional demonstrada para o desempenho de tarefas de diferente natureza. Nesta perspetiva, e desde julho, que um conjunto de polícias da PSP já se encontra a acompanhar os trabalhos dos profissionais do SEF", justifica fonte oficial desta força de segurança".
A Direção Nacional compromete-se a, "na próxima semana, apresentar às estruturas representativas dos profissionais de Polícia as linhas orientadoras relacionadas com o atual e futuro empenhamento da PSP nos aeroportos".
Essa informação será bem-vinda para a Associação Sindical dos Profissionais de Polícia (ASPP) da PSP, que manifestou ao DN a sua apreensão com a demora na tomada de várias decisões.
"Está praticamente tudo por decidir. Quem comanda os ex-inspetores do SEF em afetação funcional? Qual o horário que vão praticar? Qual o fardamento que vão utilizar? Os procedimentos entre a PSP e a AIMA? Se efetivamente os ex-inspetores vão aceitar continuar na primeira linha de controlo documental, uma vez que os números da PSP são insuficientes?", são as questões que o presidente, Paulo Jorge Santos, levantou.
Recorda ainda que, em relação à "dupla capacitação", em segurança aeroportuária e controlo de fronteiras, que os profissionais da PSP vão ter, "é a única especialidade da PSP que exige duas formações especializadas, que é auditada por entidades externas à PSP a nível nacional e internacional e que não tem nenhuma diferenciação remuneratória do resto do efetivo". No seu entender, isto "é incompreensível".
GNR com 233 militares formados
Questionado também pelo DN, o comando-geral da GNR (cuja resposta não chegou a tempo de ser publicada neste texto na edição de papel), sob liderança de Rui Ribeiro Veloso, revela que "tem atualmente 233 militares da Guarda com formação ministrada pelo SEF, tendo sido, até ao momento, realizados 5 cursos".
O porta-voz oficial garante que, "no dia 29 de outubro de 2023, a Guarda terá o efetivo todo disponível a tempo inteiro, nas fronteiras marítimas e terrestres" e que "a realização de mais ações de formação especializadas permitirá, gradualmente, a substituição faseada dos inspetores do SEF"
Segundo ainda a GNR "no decorrer da atual semana, foi concluído o processo de distribuição e reafetação dos Inspetores do SEF pelos Postos de Fronteira, tendo sido igualmente concluído, quase na sua totalidade, a distribuição dos meios materiais, incluindo os veículos, nas diversas estruturas.
A APG espera que dia 29 "os profissionais tenham já meios próprios para puderem executar a nova função convenientemente, pois sabemos que para já fazem-se transportar em meios da UCC, que já são escassos, para além de não terem computadores em número suficiente, nem mesmo gabinetes para puderem desempenhar o serviço que lhes foi atribuído. Outro problema que já surgiu tem haver com o não cumprimento do designado, no Estatuto, Horário de referência, já reportado a quem de direito por esta Associação, e isto só acontece porque por vezes surgem pessoas que lhes é dado um pouco de poder e fazem "tábua raza" do que está legislado por pensarem certamente que o podem fazer sem consequências. Aguardamos a intervenção de quem de direito para corrigir estes e outros problemas que possam ainda existir".
O presidente da Associação de Profissionais da GNR, César Nogueira, explica ainda que "os profissionais da GNR afetos a essa missão estão numa fase que se pode denominar por estágio, em que são acompanhados pelos profissionais do SEF.
Estes profissionais pertencem à Unidade de Controlo Costeiro ( UCC) da Guarda Nacional Republicana e por ora fazem parte do efetivo desta unidade como todos os outros já existentes, embora com uma escala à parte, posteriormente será criado o Grupo de Fronteiras, que apesar de ser um Grupo específico para os profissionais que irão desempenhar em exclusivo as funções que desempenhavam os inspetores do SEF, farão parte da mesma UCC".
Tal como Paulo Jorge Santos, a César Nogueira também desagrada o facto de os militares irem desempenhar as mesmas funções que os inspetores do SEF, "com a mesma competência", mas "com vencimentos bem mais reduzidos, e só por aí é bem demonstrativo da desconsideração que o governo demonstra para com os profissionais da GNR, ou então é uma enorme desvalorização pelo trabalho desempenhado pelos profissionais do SEF. Medida economicista é com toda a certeza", frisa.
Fonte: Diário de Notícias
Foto: Gerardo Santos / Global Imagens