"Sereno juízo negativo." Presidente da República veta programa Mais Habitação
Para Marcelo Rebelo de Sousa, este diploma confirma "os riscos de discurso excessivamente otimista", para o qual já tinha alertado a 9 de março.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, vetou esta segunda-feira o programa Mais Habitação, que prevê mudanças ao nível do arrendamento, dos licenciamentos ou do alojamento local.
"O Presidente da República devolveu à Assembleia da República, sem promulgação, o Decreto que aprova medidas no âmbito da habitação, procedendo a diversas alterações legislativas", pode ler-se no site da Presidência.
Numa mensagem dirigida ao Presidente da Assembleia da República, Marcelo Rebelo de Sousa defende que "não é fácil de ver de onde virá a prometida oferta de casa para habitação com eficácia e rapidez".
Para o chefe de Estado, este diploma confirma "os riscos de discurso excessivamente otimista", para o qual já tinha alertado a 9 de março.
Marcelo Rebelo de Sousa escreve que "o apoio dado a cooperativas ou o uso de edifícios públicos devolutos, ou prédios privados adquiridos ou contratados para arrendamento acessível, implicam uma burocracia lenta e o recurso a entidades assoberbadas com outras tarefas, como o Banco de Fomento, ou sem meios à altura do exigido, como o Instituto da Habitação".
Além disso, "o arrendamento forçado fica tão limitado e moroso que aparece como emblema meramente simbólico, com custo político superior ao benefício social palpável".
"O presente diploma, apesar das correções no arrendamento forçado e no alojamento local, dificilmente permite recuperar alguma confiança perdida por parte do investimento privado, sendo certo que o investimento público e social, nele previsto, é contido e lento. Não se vislumbram novas medidas, de efeito imediato, de resposta ao sufoco de muitas famílias em face do peso dos aumentos nos juros e, em inúmeras situações, nas rendas. Acordo de regime não existe e, sem mudança de percurso, porventura, não existirá até 2026", sublinha o Presidente da República.
"Nem no arrendamento forçado, nem no alojamento local, nem no envolvimento do Estado, nem no seu apoio às cooperativas, nem nos meios concretos e prazos de atuação, nem na total ausência de acordo de regime ou de mínimo consenso partidário, o presente diploma é suficientemente credível quanto à sua execução a curto prazo, e, por isso, mobilizador para o desafio a enfrentar por todos os seus imprescindíveis protagonistas - públicos, privados, sociais, e, sobretudo, portugueses em geral. Sei, e todos sabemos, que a maioria absoluta parlamentar pode repetir, em escassas semanas, a aprovação acabada de votar. Mas, como se compreenderá, não é isso que pode ou deve impedir a expressão de uma funda convicção e de um sereno juízo analítico negativos", acrescenta Marcelo Rebelo de Sousa.
O programa Mais Habitação foi aprovado em votação final global a 19 de julho no Parlamento, com a bancada do PS a votar isolada a favor do pacote legislativo.
Questionado sobre se tinha conversado com o primeiro-ministro, António Costa, sobre as razões que o levaram a decidir de uma determinada maneira, Marcelo Rebelo de Sousa sublinhou no domingo que o programa contempla um conjunto de diplomas do Governo e também da Assembleia da República. Neste caso, explicou, devia justificações a António Costa e ao presidente do Parlamento, Augusto Santos Silva.
Na sexta-feira, o chefe de Estado já tinha anunciado que a decisão apenas seria anunciada no início desta semana, apesar de este domingo ter adiantado que já tinha decidido a sua posição.
PSD, Chega, Iniciativa Liberal, PCP e BE votaram contra, enquanto Livre e PAN optaram por se abster, num derradeiro dia de votação em que os partidos de oposição ainda avocaram propostas de alteração a este pacote, mas que acabaram de novo chumbadas, tal como tinha acontecido na especialidade.
A única dúvida que Marcelo Rebelo de Sousa tinha afastado até agora foi a possibilidade do envio do diploma para o Tribunal Constitucional, adiantando que não o iria fazer, mas deixando em cima da mesa o veto, no dia em que terminava o prazo para recorrer aos juízes do Palácio Ratton.
O Mais Habitação prevê, entre outras medidas, uma isenção da tributação de mais-valias aos proprietários que vendam casas ao Estado, o fim de novos vistos gold, o aumento da dedução por dependente no âmbito do IMI Familiar, alterações à taxa autónoma dos rendimentos prediais e isenções de impostos para proprietários que retirem as casas do alojamento local até ao fim de 2024.
No setor do alojamento local, foram também aprovadas uma contribuição extraordinária e a suspensão do registo de novos alojamentos fora dos territórios de baixa densidade (sobretudo no interior), medidas polémicas e contestadas, tal como o arrendamento forçado de casas devolutas há mais de dois anos.
Fonte: TSF
Foto: Filipe Amorim/Global Imagens