Inspeção identifica indícios de irregularidade em 50% dos trabalhadores das plataformas fiscalizados

Metade dos trabalhadores abrangidos na primeira ação de fiscalização da Autoridade para as Condições de Trabalho a estafetas das plataformas digitais estavam em situação irregular. Quantos são ao certo? Ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, diz não ter ainda dados do universo de trabalhadores envolvidos nesta operação

Metade dos estafetas fiscalizados na primeira ação da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) junto das plataformas digitais, realizada na passada semana, “estavam irregulares na sua atuação, não faziam sequer parte do sistema de Segurança Social ou da Autoridade Tributária”. O balanço foi feito pela Ministra do Trabalho Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, esta terça-feira, no arranque do colóquio “O Trabalho Digno - Contexto e Leituras da Agenda”, promovido pelo CoLabor - Laboratório Colaborativo para o Trabalho, Emprego e Proteção Social, citando dados da ACT, mas admitindo não ter “dados concretos sobre o número total de trabalhadores abrangidos” na ação.

A ministra reportava-se à ação inspetiva realizada pela ACT nas cidades de Lisboa e Porto, especificamente junto de estafetas das plataformas Bolt, Glovo e Uber Eats, onde os inspetores procuraram sobretudo "verificar as responsabilidades reais [das plataformas]", ou seja, a existência de "um vínculo que pode estar dissimulado, que pode não corresponder àquilo que de facto existe", explicava aos jornalistas, na altura, a inspetora-geral da ACT, Maria Fernanda Campos.

A ação envolveu cerca de 30 inspetores da ACT, nas cidades de Lisboa e Porto, e terá permitido fiscalizar a situação laboral de um número significativo de estafetas, embora a ACT não tenha divulgado ainda um balanço efetivo da ação.

À margem do colóquio, o Expresso questionou Ana Mendes Godinho sobre a abrangência desta fiscalização e número de trabalhadores detetados em falta, mas a ministra disse dispor apenas da informação de que “50% dos estafetas identificados na ação estavam em situação de irregularidade contratual”, destacando tratar-se de "dados preliminares que não foram disponibilizados ao ministério na totalidade".

Em causa nestas situações de irregularidade estão a ausência de registo na Segurança Social ou Autoridade Tributária, mas também o próprio enquadramento contratual. À semelhança do que acontece noutras ações, a ACT procederá à notificação das plataformas para que sejam regularizadas as situações identificadas e continuará no terreno, ao longo do próximo ano, a fiscalizar a implementação das alterações à lei laboral.

Recorde-se que para esta terça-feira estava prevista a primeira audiência em tribunal de um estafeta contra uma plataforma digital, desde a entrada em vigor da nova legislação laboral, em maio deste ano. O processo, a decorrer no Tribunal do Trabalho do Porto, opõe um estafeta à plataforma Glovo, a quem requer o reconhecimento da existência de uma relação de trabalho dependente. Mas a primeira audiência, de caráter conciliatório, acabou adiado para 13 de julho.

GOVERNO PREPARA OPERAÇÃO DE CRUZAMENTO DE DADOS
Em matéria de combate à precariedade, Ana Mendes Godinho sinalizou ainda que “está a ser preparada uma ação de fiscalização inteligente, com cruzamento de dados com a Segurança Social e recurso às novas tecnologias” que permitirá identificar situações de precariedade, nomeadamente “através da duração de contratos a prazo”.

Em janeiro deste ano, Ana Mendes Godinho já tinha avançado que um cruzamento de informação realizado entre as bases de dados da Segurança Social e da Autoridade Tributária permitiu identificar cerca de 300 mil contratos a termo cujo prazo legal estava já ultrapassado. A partir desse cruzamento de dados, dizia na altura a ministra, resultaria uma ação de deteção inteligente, a acontecer a entrada em vigor da Agenda do Trabalho Digno, “para que as empresas sejam convidadas a regularizar estas situações”. É essa a ação que agora avança.

Ana Mendes Godinho recordou esta terça-feira que a taxa de precariedade nacional entre os jovens recuou de 68% para 59%, desde 2015. Mas admitiu que há ainda muito caminho a percorrer, vincando que “a precariedade não é, nem pode ser um modo de vida”.

Fonte: Expresso
Foto: Ana Baião