O que diz o decreto sobre o estado de emergência: ponto a ponto

Leia aqui o que está previsto no decreto que propõe a declaração de plano de emergência que teve parecer favorável do Governo e da Assembleia da República.

O decreto presidencial que declara o estado de emergência e que foi aprovado pela Assembleia da República volta, entretanto, ao Palácio de Belém para assinatura do Presidente da República, e depois segue para a Imprensa Nacional, para ser publicado em Diário da República ainda nesta quarta-feira.

O decreto determinará que o estado de emergência vigorará da meia-noite desta quarta-feira até às 23h59 de dia 2 de Abril. Quinze dias é o prazo máximo em que pode vigorar o estado de emergência à luz da Constituição. Mas, no fim desse prazo, pode ser renovado.

Fica parcialmente suspenso o exercício dos seguintes direitos: direito de deslocação e fixação em qualquer parte do território nacional; propriedade e iniciativa económica privada; direitos dos trabalhadores; circulação internacional; direito de reunião e de manifestação; liberdade de culto, na sua dimensão colectiva; e direito de resistência.


Cidadãos poderão ser obrigados a ficar em casa ou internados
O projecto de declaração de estado de emergência que chegou ao Parlamento não tem ainda as datas de entrada em vigor e do fim do período que abrange, porque isso será definido agora.

A declaração de estado de emergência pressupõe que fica “parcialmente suspenso” o direito de deslocação e de fixação dos cidadãos em qualquer parte do território nacional, podendo ser impostas as “restrições necessárias para reduzir o risco de contágio e executar as medidas de prevenção e combate à epidemia”. Isto significa que pode ser determinado o “confinamento compulsivo” em casa ou em estabelecimento de saúde, assim como o estabelecimento de cercas sanitárias (como a que já acontece em Ovar).

Também poderão ser proibidas as deslocações e a permanência na via pública sem justificação (não estão abrangidas as deslocações profissionais – de e para o trabalho ou dos profissionais de distribuição, por exemplo) ou para ir ao médico. Caberá ao Governo, nos próximos dias, definir restrições e “especificar as situações e finalidades em que a liberdade de circulação individual, preferencialmente desacompanhada, se mantém”.

Direito à greve está suspenso
Depois de na terça-feira à noite o Conselho de Ministros ter decretado a requisição civil dos estivadores do Porto de Lisboa que não asseguraram os serviços mínimos que estavam definidos ao alargarem sucessivamente os períodos da greve, agora o direito à greve fica mesmo “suspenso”. Porque, justifica-se no texto, pode “comprometer o funcionamento de infra-estruturas críticas ou de unidades de prestação de cuidados de saúde, bem como em sectores económicos vitais para a produção, abastecimento e fornecimento de bens e serviços essenciais à população”.

Reuniões e manifestações podem ser proibidas
Não há números, porque isso será competência do Governo à medida que for necessário restringir o contacto entre os cidadãos, mas a declaração de estado de emergência admite que sejam impostas pelas autoridades (com base em conselho das autoridades de saúde) limites para a realização de reuniões ou manifestações que possam potenciar a transmissão do coronavírus. Como, aliás, já hoje é aconselhado.

Apesar de terem sido já suspensas praticamente todas as actividades religiosas, o decreto prevê que possam ser limitadas ou proibidas as celebrações de cariz religioso e de outros eventos de culto que impliquem uma aglomeração de pessoas. Numa altura de Quaresma para a Igreja Católica, esta questão poderá vir a colocar-se. Tal como também é expectável que possam ser impostas restrições, por exemplo, em funerais.

Estas restrições “visam reduzir o risco de contágio e executar as medidas de prevenção e combate à epidemia”

Qualquer trabalhador pode ser obrigado a trabalhar noutro local, serviço ou horário
Tal como pode ser feita a requisição civil de empresas e património, o mesmo pode acontecer com os trabalhadores. O texto afirma que isso se aplica a “quaisquer trabalhadores de entidades públicas ou privadas”, qualquer que seja o seu vínculo (contrato permanente, a termo ou colaborador pontual). Podem ser obrigados a apresentarem-se ao serviço e terem de passar a “desempenhar funções em local diverso, em entidade diversa e em condições e horários diversos” daqueles que correspondem ao seu vínculo à sua empresa.

Mas isso aplica-se, "designadamente, aos trabalhadores dos sectores da saúde, protecção civil, segurança e defesa e ainda de outras actividades necessárias ao tratamento de doentes, à prevenção e ao combate à propagação a epidemia”. Aplica-se, ainda, a sectores ligados à produção, distribuição e abastecimento de bens e serviços essenciais, ao funcionamento de sectores vitais da economia, à operacionalidade de redes e infra-estruturas críticas e à manutenção da ordem pública.

Restrições previstas na circulação nas fronteiras já estão quase todas em funcionamento
A lista de restrições à circulação internacional está já está parcialmente em vigor — com o controlo parcial de fronteiras, por exemplo — ou já decidida para avançar — como a suspensão de voos para fora e de fora da UE, que arranca esta noite às 24h. Mas o decreto enumera a lista de medidas a que o Governo pode recorrer:

controlos fronteiriços de pessoas e bens ("em articulação com as autoridades europeias e em estrito respeito pelos tratados da União Europeia"), incluindo controlos sanitários em portos e aeroportos, com a finalidade de impedir (ou condicionar) a entrada no país de pessoas de forma a evitar o risco de propagação da epidemia ou para não sobrecarregar os serviços de saúde (por exemplo, de estrangeiros que quisessem vir tratar-se a Portugal);
quem entrar em Portugal pode ser obrigado ao “confinamento compulsivo” , isto é, pode ter de ficar sujeito a uma quarentena;
tomar medidas para assegurar a circulação internacional de bens e serviços essenciais.
Requisição civil de empresas e do seu património
No caso das empresas, a declaração prevê que possa ser requisitada pelo Estado a “prestação de quaisquer serviços e a utilização de bens móveis e imóveis, de unidades de prestação de cuidados de saúde, de estabelecimentos comerciais e industriais, de empresas e outras unidades produtivas”.

Fica também permitido ao Estado exigir que entrem em funcionamento “empresas, estabelecimentos e meios de produção”, que funcionem de forma limitada, que encerrem ou até que mudem a sua actividade. E pode até ser-lhes imposto que alterem o tipo de produtos que fabricam, assim como o preço desses bens que produzem ou comercializam e a forma como fazem a sua distribuição e venda no mercado.

Fonte: Público