Associação Portuguesa de Bioética entregou no Parlamento parecer para alterar lei do Testamento Vital

Rui Nunes, presidente da Associação Portuguesa de Bioética, defende que os hospitais devem ser obrigados a informar doentes da possibilidade de efetuarem o Testamento Vital. Proposta de alteração da lei em vigor foi entregue esta terça-feira na Assembleia da República.

O presidente da Associação Portuguesa de Bioética (APB), Rui Nunes, entregou, na manhã desta terça-feira, na Assembleia da República um parecer com vista à alteração da Lei de 2012 que regula as Diretivas Antecipadas de Vontade, de forma a que os hospitais passem a ser obrigados a informar os doentes, no momento da admissão, da possibilidade de efetuarem o seu Testamento Vital.

“Volvidos quase oito anos após a legalização do Testamento Vital a maioria dos portugueses desconhece a sua existência”, salienta Rui Nunes, considerado o 'pai' desta medida que permite aos utentes estabelecer os cuidados de saúde que deseja ou não receber caso, por qualquer razão, se encontre incapaz de expressar a sua vontade pessoal e autonomamente.

De acordo com Rui Nunes, existem atualmente cerca de 25 mil manifestações antecipadas de vontade no Registo Nacional do Testamento Vital (RENTEV), o que se explica “pela falta de literacia em saúde da população, pela escassa mobilização de médicos e outros profissionais de saúde para a capacitação dos doentes e familiares, bem como a ausência de uma estratégia educativa na escola, desde logo na área da educação para a cidadania, e pela falta de uma estratégia que promova esta discussão em jovens na fase formativa da personalidade”.

Ao Expresso, o principal mentor do Testamento Vital em Portugal afirma que durante alguns anos o esclarecimento sobre o que é e como funciona o Testamento Vital foi levado às salas de aulas das escolas do município do Porto, defendendo Rui Nunes que o tema seja debatido nas aulas de educação cívica de todo o país. Para Rui Nunes, é na faixa etária dos 14 e 15 anos que o conhecimento sobre o Testamento Vital “funciona melhor”, por ser uma fase decisiva “da formação da personalidade”.

“Mais do que uma questão de saúde, a Diretiva Antecipada de Vontade é uma questão de cidadania”, adverte Rui Nunes, sublinhando que todo o processo de registo do Testamento Vital é gratuito para os utentes ou para os familiares nomeados como procuradores dos doentes.

O parecer levado à Assembleia da República por Rui Nunes visa difundir o conhecimento da população sobre a existência do RENTEV e, consequentemente, aumentar o número de registos efetuados. Na proposta entregue esta manhã ao vice-presidente da Assembleia da República, António Filipe, a APB propõe uma alteração da legislação de modo a determinar que na admissão hospitalar, tanto no sector público, como no privado ou social, existam condições para que os utentes e suas famílias sejam adequadamente informados desta possibilidade.

O presidente da APB sublinha que no parecer “não está implícita a obrigatoriedade de todos os utentes efetuarem o seu registo, pois qualquer pessoa é, e será sempre, livre de querer ou não efetuar uma diretiva antecipada de vontade”. “O que se pretende com esta alteração é que sejam criadas condições para a informação fluir com maior facilidade e assim chegar mais facilmente aos utentes dos hospitais portugueses”, adianta.

Rui Nunes assegura que esta medida não implica um significativo aumento de custos para o Ministério da Saúde nem exige grandes alterações a nível organizativo. “Trata-se apenas de dotar o pessoal administrativo responsável pela admissão de doentes dos conhecimentos básicos para proceder a este tipo de informação, sinalizando o utente para um profissional de saúde quando se pretenda obter esclarecimentos adicionais sobre o tema”, explica.

Para a implementação desta alteração à lei, o considerado 'pai' do Testamento Vital frisa que é suficiente utilizar algum tempo do pessoal administrativo bem como, complementarmente, elaborar um folheto explicativo onde conste uma descrição sumária das opções possíveis. “O sistema de saúde português tem a obrigação de se adaptar a uma evolução civilizacional ímpar da nossa sociedade, pelo que deve assumir a responsabilidade de contribuir para uma melhor formação da população portuguesa”, preconiza Rui Nunes, concluindo que, desta forma, “se contribui para o respeito dos direitos inalienáveis dos doentes à informação e ao consentimento”.

O Testamento Vital define os cuidados de saúde que o paciente quer receber em caso de morte iminente ou de incapacidade física ou mental, evitando, como lembra Rui Nunes, a obstinação terapêutica e o prolongamento artificial da vida.

A Associação Portuguesa de Bioética (APB) foi fundada em julho de 2002 por um conjunto de especialistas nesta área do conhecimento, tendo por objetivos essenciais a investigação, a promoção e a difusão da bioética enquanto área científica e de intervenção social.

Fonte: Expresso
Foto: Lucília Monteiro