Fisco vai passar a comunicar em versão "português suave"
Autoridade Tributária aposta numa linguagem mais amigável com os contribuintes no cumprimento das obrigações fiscais.
É uma nova atitude adotada pelo fisco na comunicação para não "irritar" os contribuintes ou para que cumpram as obrigações fiscais, explicando o caso e porque é que está a ser notificado pela administração tributária (AT).
"Muitas vezes o que é que leva os contribuintes - e bem - a ficarem irritados?", questionou ontem o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. "Recebem uma notificação que, muitas vezes, não entendem sequer o que é", conclui António Mendonça Mendes para justificar a mudança de atitude.
"Se lhe é explicado o que é o imposto até decidem não litigar, ou se decidem litigar têm outra consciência de porque o estão a fazer", assinalou o responsável na Comissão de Orçamento, Finanças onde foi ouvido no âmbito do relatório sobre fraude e evasão fiscais.
O objetivo é não só tornar a linguagem mais clara mas também "convencer" o contribuinte a pagar o que deve ao Estado, para melhorar a eficácia das notificações e, por conseguinte, aumentar a receita, evitando por outro lado custos de litigância.
O modelo inglês
A alteração da linguagem utilizada nas cartas enviadas pelo fisco é inspirada numa experiência-piloto levada a cabo no Reino Unido e com resultados promissores no pagamento de impostos em falta. E esse foi o exemplo utilizado por Mendonça Mendes.
"Há um país que comparava dois tipos de notificações: uma em que dizia que se não pagar em X tempo paga uma multa e outra em que explicava que o senhor tem este imposto a pagar. Já quase todas as pessoas pagaram este imposto e é importante que o faça. A segunda teve maior eficácia", assinalou o secretário de Estado.
É este tipo de linguagem, mais suave e explicativa, que a Autoridade Tributária quer passar a utilizar, mesmo que, como assinalou Mendonça Mendes, os contribuintes "não esperem amizade" da parte do fisco.
O caso do erro no IRS de 2015
A utilização de linguagem compreensível por parte dos contribuintes já foi testada recentemente com os erros detetados na liquidação do IRS de 2015, que implicou um novo apuramento do imposto em cerca de dez mil declarações, no valor de 3,5 milhões de euros.
"Não foram enviadas apenas as liquidações, que formalmente são válidas do ponto de vista legal", começou por afirmar Mendonça Mendes. "Foi enviada uma carta explicativa e quais os meios que tinham ao seu dispor para se defender ou para poder pagar. Ninguém estava à espera para fazer uma reparação", assinalou o governante.
De facto, a carta tem uma linguagem mais simples do que é habitual por parte do fisco, assumindo o erro e explicando a razão do erro e a forma como os contribuintes podem reclamar.
Um novo serviço de apoio e defesa do contribuinte
A Autoridade Tributária vai ter a partir de janeiro um novo serviço de apoio e defesa do contribuinte para os casos de contestação ao fisco. Vai chamar-se Serviço de Apoio e Defesa do Contribuinte e funcionará, numa primeira fase, através do e-balcão e do atendimento telefónico.
O secretário de Estado referiu que foram estudadas duas formas de defesa do contribuinte: uma através da reativação da figura do provedor e outra com a criação de um serviço específico dentro da AT. E optou-se pela segunda solução que vai avançar já no início do ano.
Para tal, a Autoridade Tributária lançou concursos internos para recrutar mais funcionários, sendo que ainda não está definido o número necessário.
Em março deste ano, Mendonça Mendes referiu, em declarações à agência Lusa, que "a AT faz cerca de 25 milhões liquidações por ano e, dessas, há cerca de 45 mil que são objeto de contencioso", o que permite concluir que "a esmagadora maioria das liquidações são bem feitas, que a introdução dos automatismos não afeta a qualidade das liquidações" e que, medido em termos percentuais, o grau de litigância é "relativamente pequeno", acrescentando que havia margem suficiente para reforçar a relação de confiança entre as duas partes e para aumentar o grau de cumprimento voluntário, que supera os 90%.
Fonte: Diário de Notícias/ Paulo Ribeiro Pinto