CMVM visitou 8 auditoras e encontrou quase 300 irregularidades

As “deficiências” nas auditorias são muitas e a atuação dos revisores oficiais de contas tem de melhorar. A opinião é da CMVM que, desde que é o supervisor deste sector, já decidiu quatro processos de contraordenação com condenação do auditor

A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) visitou, entre junho de 2018 e maio deste ano, oito auditoras. Nessas ações, em que exerce a supervisão de forma presencial, o regulador descobriu falhas que obrigaram a que fossem emitidas quase 300 recomendações – ainda que, claro, o grau de gravidade de cada irregularidade seja variável. Aliás, até há melhorias face aos anos anteriores, mas as deficiências continuam a ser muitas.

O regulador comandado por Gabriela Figueiredo Dias tem uma conclusão preliminar sobre os trabalhos de auditoria feitos a entidades de interesse público (empresas estatais, cotadas, fundos de investimento, etc), missão que tem desde 2016: “Continuam a ser detetadas deficiências na generalidade das supervisões efetuadas”; “existem várias dimensões da atuação dos revisores oficiais de contas e das sociedades revisoras oficiais de contas que continuam a carecer de melhoria”.

São dois os tipos de supervisão que a CMVM faz para ter esta perspetiva: presencial, com visitas às sociedades revisoras oficiais de contas ou por decisão própria ou na sequência de denúncias; e contínua, em que analisa a idoneidade dos auditores (foi na sequência de uma destas ações que sócios da KPMG que auditaram o BES deixaram de ser revisores oficiais de contas) e a aferição do cumprimento de deveres específicos.

“No ciclo 2018/2019, foram abertas seis novas ações de supervisão presencial e 27 novas ações de supervisão contínua. No mesmo período, foram encerradas oito ações de supervisão presencial (ações de ciclos anteriores) e 51 ações de supervisão contínua”, apontam os resultados do sistema de controlo de qualidade de auditoria referente ao período entre junho de 2018 e maio de 2019 (não coincide com o ano civil, mas sim com o período de certificação de contas que estas sociedades fazem).

EMITIDAS 291 RECOMENDAÇÕES
Das oito ações que foram concluídas nos 12 meses terminados em junho deste ano, a CMVM emitiu 291 recomendações para correção das deficiências encontradas. A maior parte, 183, diz respeito aos dossiês de auditoria, ou seja, ao cumprimento das normas internacionais de auditoria.

Falhas na documentação de auditoria (por exemplo, não permite ao auditor perceber o trabalho que foi feito pela entidade auditada, nem há separação clara do que foi feito pela auditada e pelo auditor) e insuficiência da prova de auditoria (por exemplo, falta a avaliação dos pressupostos que levaram à identificação das perdas por imparidade) são as que falhas mais surgem nas ações da CMVM, mas também foram detetadas descrições de alertas dos auditores (as chamadas reservas e ênfases às contas) que estão feitas de forma “imprecisa e confusa”.

As restantes 108 recomendações lançadas pela CMVM (que tem no administrador José Miguel Almeida o responsável pela área) têm já que ver com o sistema de controlo da qualidade do trabalho, como insuficiências na garantia de independência ou incumprimentos na rotação do sócio responsável pela auditoria.

A gravidade de cada uma das irregularidades é distinta, mas o relatório da CMVM – que tem uma equipa de 15 funcionários neste ramo da supervisão de auditoria – não as diferencia.

QUATRO CONTRAORDENAÇÕES EM QUATRO ANOS
Durante este ciclo 2018/2019 foi ainda decidido um processo de contraordenação com condenação, por violação do estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas. Um auditor, não identificado, falhou 80 vezes no “dever de arquivo dos documentos inerentes à revisão legal de contas no prazo de 60 dias posteriores à data da certificação legal de contas ou do relatório de auditoria”.

A coima única aplicada ao visado foi de 50 mil euros, ainda que suspensa parcialmente em metade do seu valor por dois anos (ou seja, terá de pagar essa metade se cometer irregularidades idênticas neste período).

Mas não foi o único. Antes dele, a CMVM já tinha decidido dois, e, mesmo depois, já em julho houve uma outra condenação.

O mais recente caso, decidido em julho, deveu-se ao facto de o auditor de uma entidade ter prestado à mesma empresa um serviço que não de auditoria (algo a que está impedido legalmente), nem tão pouco comunicou-o à CMVM. A coima foi de 25 mil euros.

Falhas na assinatura do revisor principal e ausência de comunicação aos supervisores motivaram uma admoestação num terceiro caso (sem sanção pecuniária), enquanto irregularidades cometidas na rotação dos sócios que seguem as empresas (obrigatória por lei) levaram uma auditora a sofrer uma coima de 20 mil euros, ainda que totalmente suspensa por dois anos.

50 MIL EUROS, PARA JÁ
Deste conjunto, a CMVM teve direito a 50 mil euros, sendo que há outros 45 mil que poderão ter de ser devolvidos em caso de incumprimento, devido à suspensão total ou parcial das coimas.

Noutros setores, ainda ontem o Expresso deu conta de um processo de contraordenação da CMVM à Orey Financial, num montante mais elevado, de 150 mil euros.

Fonte: Expresso