Código do Trabalho: a lei que dividiu a geringonça entra em vigor em outubro

As alterações ao Código do Trabalho foram publicadas esta quarta-feira em Diário da República. É o culminar de um longo processo, que afastou o PS dos parceiros à esquerda. Saiba tudo o que muda

Mais de um ano depois de a proposta do Governo ter sido inicialmente votada na Assembleia da República, as alterações ao Código do Trabalho foram publicadas esta quarta-feira em Diário da República e entra em vigor em outubro.

É o culminar de um longo processo que dividiu a geringonça, afastando PS de BE e PCP. E que, entre outros pontos, vai limitar a duração máxima dos contratos a termo, bem como as renovações dos contratos temporários.

O processo de revisão do Código do Trabalho revelou-se um verdadeiro campo minado. Depois do acordo na Concertação Social, em maio de 2018, a proposta legislativa do Governo foi recebida na Assembleia da República com muitas reservas dos parceiros à esquerda. E reticências até da própria bancada parlamentar do PS, com muitas vozes críticas e Carlos César, o líder parlamentar socialista, a admitir que o acordo assinado entre patrões e a UGT podia ser “melhorado e modificado”.

Em julho do ano passado, a proposta acabou por ser aprovada na generalidade com os votos favoráveis do PS, abstenção do PSD, CDS-PP e PAN, e os votos contra do PCP e BE. E os deputados do PS viabilizaram mesmo algumas propostas dos partidos mais à esquerda.

Com o documento em discussão na especialidade, seguiram-se meses de negociações no Parlamento. Apenas para ficar tudo na mesma.

O PS acabou por não fazer cedências à esquerda e manteve o guião traçado na concertação social. Os socialistas acabaram até por alinhar no chumbo das propostas mais à esquerda que tinham viabilizado um ano antes.

PCP e BE mantiveram as linhas vermelhas – em particular no que respeita ao alargamento do período experimental nos contratos sem termo e generalização a todos os sectores de atividade dos contratos de muito curta duração – e votaram contra.

E PSD e CDS-PP abstiveram-se, amarrados ao acordo alcançado na concertação social – apesar de vincarem que não havia necessidade de fazer uma revisão do Código do Trabalho.

Depois de promulgado pelo Presidente da República, as alterações às leis laborais foram agora publicadas em Diário da República.

Mas, mesmo depois de entrarem em vigor, esta saga ainda pode conhecer desenvolvimentos no Tribunal Constitucional. É que PCP e BE anunciaram o pedido de fiscalização sucessiva do diploma.

SAIBA TUDO O QUE MUDA
Limite de seis renovações para contratos temporários

Os contratos de trabalho temporário terão um limite máximo de seis renovações. Empresas ficam obrigadas a informar o trabalhador temporário do motivo para a celebração do contrato e, em caso de violação das regras, terão de integrar os trabalhadores.

Contratos de muito curta duração alargados

Os contratos de muito curta duração serão alargados dos 15 para os 35 dias e generalizados a todos os sectores. Para isso basta que as empresas comprovem um acréscimo excecional, decorrente por exemplo de efeitos de sazonalidade.

Aumento das horas de formação para 40 anuais

A proposta do PCP de aumento do número mínimo de horas de formação, das atuais 35 para as 40 horas anuais, foi aprovada. Mas a norma que determinava que o crédito para horas de formação que não fosse utilizado cessaria passados três anos, foi rejeitada porque o PS mudou o seu sentido de voto.

Contratação a termo com limite de dois anos

O limite máximo dos contratos a termo reduz dos três para os dois anos e os contratos podem ser renovados até três vezes, desde que a sua duração total não exceda o período inicial dos contratos. A contratação a termo para postos de trabalho permanentes deixará de ser possível para os jovens à procura do primeiro emprego e fica apenas reservada a desempregados de muito longa duração.

Período experimental alargado para 180 dias

O período de experiência exigido aos jovens à procura do primeiro emprego e aos desempregados de longa duração, quando contratados sem termo, passa de 90 para 180 dias.

Banco de horas individual revogado

A revogação do banco de horas individual foi aprovada, mas pode manter-se durante o prazo máximo de um ano, contado a partir da entrada em vigor das novas regras. Os bancos de horas grupais foram viabilizados, mas terão de ser aprovados em referendo pelos trabalhadores.

Taxa por rotatividade excessiva só avança em 2021

PS e PSD viabilizaram a criação da contribuição adicional por rotatividade excessiva, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2020. Contudo, como a taxa depende de regulamentação sectorial específica, as empresas só começarão a pagar em 2021.

Prazos para adesão a regulamentações coletivas

A adesão individual de trabalhadores não sindicalizados a convenções coletivas passa a ter prazos definidos na lei: têm três meses desde a entrada em vigor da convenção ou desde o início do seu contrato para escolherem; o tempo total de adesão fica limitado a 15 meses; e para se desvincularem têm de avisar o patrão com seis meses de antecedência.

CRONOLOGIA DA REVISÃO DA LEI LABORAL
2016

Abril Começam as reuniões do grupo de trabalho formado por PS e BE para a definição de um “Plano de combate à precariedade”.

Novembro O ministro Vieira da Silva, apresenta aos parceiros sociais o “Livro Verde sobre as Relações Laborais”. O documento é atualizado em janeiro de 2018.

2017

Janeiro Acordo da concertação social aprova aumento do salário mínimo, mas empurra para 2018 alterações mexidas na lei laboral.

2018

Março Governo apresenta uma lista de 27 medidas para a revisão do código laboral. Entre elas estão a duração dos contratos a prazo, a criação de uma contribuição adicional para as empresas que recorram a este tipo de contratos e mexidas no banco de horas. Várias medidas saem do grupo de trabalho formado com o BE.

Maio Alcançado um acordo na concertação social para revisão do código do trabalho. É subscrito pelo Governo, patrões e UGT. CGTP fica de fora.

Junho Proposta do Governo com base no acordo da concertação começa a ser debatida na Assembleia da República.

Julho Proposta é aprovada na generalidade com os votos favoráveis do PS, abstenção do PSD, CDS-PP, PAN e votos contra do PCP e BE. Bancada do PS aprova algumas das propostas dos partidos mais à esquerda. O documento segue para discussão na especialidade.

2019

Janeiro Criação no Parlamento do grupo de trabalho — leis laborais.

Março a abril Adiamento sucessivo do prazo de entrega das propostas de alteração ao Código do Trabalho. Acabam por 
ser apresentadas em abril.

Maio a julho Debate e votações indiciárias da proposta do Governo, das propostas de alteração e dos vários projetos de lei do PCP, BE e PEV. PS junta-se a PSD e CDS-PP no chumbo às propostas da esquerda, incluindo as que tinha começado por aprovar na generalidade. Direita viabiliza propostas previstas no acordo da concertação social.

Julho Ratificação das votações indiciárias na comissão de trabalho e Segurança Social e votação final no plenário da Assembleia da República. Proposta do Governo é aprovada apenas com os votos favoráveis do PS e a abstenção do CDS-PP e do PSD. BE e PCP votam contra

Agosto O Presidente da República promulga as alterações à legislação laboral

Fonte: Expresso