Governo admite alargar requisição civil. Incumprimento "grave" em Loulé
O ministro dos Negócios Estrangeiros afirmou que um eventual incumprimento dos serviços mínimos, como ameaçado pelo sindicato, obrigará o Governo alargar a requisição civil. Posição confirmada pelo ministro do Ambiente, Matos Fernandes, que destacou o "caso grave de incumprimento" em Loulé.
"O que tenho a dizer sobre isso é que evidentemente a requisição civil é imperativa e, portanto, espero que todos aqueles abrangidos pela requisição civil a cumpram", disse o ministro, à margem de uma entrevista sobre outro tema a divulgar em data futura.
Santos Silva falava à Lusa depois de o porta-voz do Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP), Pedro Pardal Henriques, ter afirmado que os trabalhadores não vão cumprir hoje os serviços mínimos nem a requisição civil, em solidariedade para com os colegas que foram notificados por não terem trabalhado na terça-feira.
"Quanto ao incumprimento de serviços mínimos, se nas regiões do país em que não há requisição civil os serviços mínimos forem incumpridos, teremos naturalmente que avançar para o alargamento da requisição civil, porque a requisição civil é o instrumento que temos quando os serviços mínimos não estão a ser cumpridos", acrescentou o "número dois" do governo.
Santos Silva frisou contudo que é necessário aguardar por "uma confirmação objetiva e independente" da situação."A ENSE [Entidade Nacional para o Setor Energético] avalia ao minuto o abastecimento de energia, designadamente nas áreas que são críticas, e portanto vamos esperar que haja uma ideia mais clara do que está a suceder", disse.
"Sendo certo que, quando os serviços mínimos não são cumpridos, tem de se avançar para a requisição civil e as pessoas que não aceitarem, não cumprirem, não acatarem a requisição civil são responsabilizadas à luz da lei pelos mecanismo normais de um Estado de Direito", insistiu, precisando que "incumprir uma requisição civil é incorrer no crime de desobediência qualificada".
Caso grave de incumprimento em Loulé
Em conferência de imprensa, o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, confirmou que em caso de incumprimento por parte dos motoristas de matérias perigosas, o governo poderá decidir alargar a requisição civil. "Ao final do dia, faremos a avaliação", explicou o governante.
Mostrando-se otimista em relação à situação no terreno, onde a maior parte dos serviços mínimos estão a ser assegurados, o ministro destacou pela negativa a situação em Loulé. "Há um caso grave de incumprimento da requisição civil", admitiu, explicando que os motoristas escalados para fazer o transporte de combustível de Loulé para o aeroporto de Faro "faltaram todos ao trabalho".
Matos Fernandes esclareceu ainda que o transporte de combustível está entretanto a ser feito por seis elementos da GNR.
Motoristas ameaçam não cumprir serviços mínimos
Ao terceiro dia de greve, os motoristas ameaçaram não cumprir a requisição civil decretada pelo Governo. Francisco São Bento, presidente do Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP), garantia esta quarta-feira de manhã, em Aveiras de Cima, que os trabalhadores "não vão cumprir os serviços mínimos" e que o sindicato continua aguardar que "haja abertura por parte da ANTRAM [patrões]", para negociar, acusando as empresas de estarem "a impor trabalhos diários normais, como se não houvesse greve".
Esta tomada de posição foi uma reação às declarações do ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Matos Fernandes, que na terça-feira disse que "14 trabalhadores não cumpriram a requisição civil", sendo que 11 já foram notificados pelo incumprimento da requisição civil. A GNR identificou três no distrito de Faro, quatro em Lisboa e três em Setúbal. "Todos alegaram baixa médica", revelou Matos Fernandes.
"Se é para levar os 11 colegas presos, então vão ter de levar todos, têm que arranjar autocarros grandes para poder levar esta gente toda", reagia, esta manhã, Pardal Henriques, advogado do sindicato de motoristas de matérias perigosas, sublinhando term provas de que há motoristas que "andam a fazer serviços particulares, serviços que não fazem parte da greve". O também porta-voz do SNMMP garantia que os motoristas não iam cumprir "nem serviços mínimos nem requisição civil" na sequência das notificações do governo.
No entanto, depois de ao início da manhã os camiões terem parado em alguns locais, como à entrada da refinaria de Leça da Palmeira, ao final da manhã os camiões circulam nas refinarias de Aveiras, Leça da Palmeira e Sines. Nesta última, surgia mesmo a garantia, por parte de um dirigente sindical, de que os motoristas em greve "estão a cumprir os serviços mínimos".
De Sines surgiu de resto um eco de posições divergente no seio do próprio sindicato de motoristas. "Estamos a trabalhar e a cumprir os serviços mínimos, tal como aconteceu ontem [terça-feira], e já comuniquei ao sindicato que não vou dizer aos restantes colegas para não garantirem os serviços mínimos porque em Sines foi imposta uma requisição civil", afirmou Carlos Bonito, o coordenador do Sul do sindicato dos motoristas de matérias perigosas, à agência Lusa.
A situação em Sines, no distrito de Setúbal, contrasta com a decisão anunciada pelo porta-voz do sindicato, Pardal Henriques, segundo o qual os trabalhadores não iriam cumprir serviços mínimos nem a requisição civil, em solidariedade para com os colegas que foram notificados.
Entretanto André Almeida, porta-voz da ANTRAM, a associação das empresas de transportes de mercadorias, considerou que o apelo hoje lançado pelo sindicato dos motoristas de matérias perigosas para que ninguém trabalhe vai prejudicar gravemente a economia: "Isso vai significar problemas graves na economia portuguesa."
A GNR e a PSP asseguraram o transporte de combustível em 28 camiões-cisterna
A GNR e a PSP asseguraram, na segunda e terça-feira, o transporte de combustível em 28 camiões-cisterna no âmbito da situação de alerta declarada pelo Governo devido à greve dos motoristas de matérias perigosas, foi anunciado esta quarta-feira. "Na sequência da situação de alerta declarada pelo ministro da Administração Interna, foram assegurados pela Guarda Nacional Republicana [GNR] e pela Polícia de Segurança Pública [PSP], entre os dias 12 e 13 de agosto, transportes de combustível em 28 veículos pesados de transporte de mercadorias perigosas", refere o ministério da Administração Interna em comunicado.
71 camiões saíram de Aveiras
Os motoristas de empresas conduziram entre as 06.00 e as 10.00 pelo menos 71 camiões-cisterna, apesar do aviso do porta-voz dos motoristas de matérias perigosas de que ninguém ia "fazer absolutamente nada hoje", disse à Lusa fonte governamental. De acordo com a mesma fonte, partiram de Companhia Logística de Combustíveis (CLC), em Aveiras de Cima em Lisboa, 35 camiões entre as 06:00 e as 08:00, e 36 entre as 08:00 e as 10:00.
Estes camiões-cisterna que saíram estavam a ser conduzidos por motoristas de empresas e sem escolta de militares, adiantou a mesma fonte.
Camiões sob escolta em Leça da Palmeira
Já esta manhã, em Leça da Palmeira, vários camiões entraram pelas 10.00 sob escolta policial na refinaria da Petrogal, embora o sindicato assegurasse que o "boicote" aos serviços mínimos é para continuar."O boicote não terminou. Os motoristas que estavam em greve continuam em greve. A maior parte dos motoristas que entraram [na refinaria] não estavam aqui [no piquete de greve], mas foram pressionados para vir trabalhar", disse Manuel Mendes, coordenador do Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP), em declarações aos jornalistas no local.
Numa zona do país onde o Governo não decretou requisição civil ou militar, vários motoristas com destino à Petrogal de Matosinhos, distrito do Porto, recusaram hoje fazer serviços mínimos, mas pelas 10.00 vários camiões entraram na empresa sob escolta policial, entretanto desmobilizada, constatou a Lusa no local.
Ao início da manhã a Polícia de Segurança Pública tinha mandado retirar os camiões que, em protesto, estavam parados junto à entrada da refinaria. Os motoristas acataram a ordem e decidiram, então, tirar os camiões mas sem entrar na refinaria até que chegaram os colegas que estão a cumprir serviços mínimos.
Manuel Mendes, um dos coordenadores do sindicato de motoristas de matérias perigosas em Leça da Palmeira, disse que os grevistas estavam "a abordar os outros colegas, a bem", para "pararem" e se juntarem a quem está na paralisação, pois o objetivo da greve é serem "tratados com dignidade" e terem "melhores salários".
O delegado sindical admitiu que os motoristas estariam a boicotar os serviços mínimos e queriam forçar o alargamento da requisição civil também à zona norte. "Temos que parar com esta brincadeira, temos motoristas ameaçados de prisão, temos motoristas ameaçados de processos. Aqui ainda não temos a requisição civil, eles que a façam. Estamos prontos para trabalhar, mas queremos condições e queremos que eles acabem com esta palhaçada", acrescentou Manuel Mendes, citado pelo jornal Observador.
À SIC, Manuel Mendes denunciou ameaças de despedimentos a trabalhadores que recusam cumprir a requisição para serviços mínimos.
O que acontece a quem não cumprir?
Quem não cumprir a requisição civil incorre num "crime de desobediência e a despedimento por justa causa", segundo o advogado de Direito Laboral, Luís Gonçalves da Silva. Segundo explicou à Lusa o especialista, a requisição civil "coloca as pessoas ao dispor do Estado, ou seja, ficam requisitadas e o vínculo laboral é entre o trabalhador e o Estado".
Caso haja incumprimento da requisição civil, além das sanções disciplinares como o despedimento por justa causa, o Código Penal prevê no artigo 348.º o crime por desobediência a quem faltar "a ordem ou a mandado legítimos, regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente". Nestes casos, os trabalhadores são punidos com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias, em caso de desobediência simples, ou prisão até dois anos e multa até 240 dias, em situação de desobediência qualificada.
O crime por desobediência deve ser "cominado no ato da requisição civil", ou seja, os trabalhadores têm de ser avisados que o incumprimento pode levar a pena criminal, disse Gonçalves da Silva.
No domingo, o primeiro-ministro, António Costa, sublinhou que a violação da requisição civil "constitui crime de desobediência" e tem consequências legais previstas no código penal. Na conferência de imprensa após o Conselho de Ministros que decidiu avançar para a requisição civil, o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Tiago Antunes, reforçou que, além das sanções disciplinares, a lei prevê "crime por desobediência" nestas situações.
Governo nega troca de combustível em descargas feitas por militares
O Ministério da Defesa Nacional diz que é falso que tenha havido três situações de trocas de combustível em descargas feitas em Sesimbra, Peniche e Nazaré por militares das Forças Armadas. "O Ministério da Defesa Nacional esclarece que são falsas as informações veiculadas sobre a existência de três situações de trocas de combustível em descargas feitas em Sesimbra, Peniche e Nazaré, por militares das Forças Armadas", afirmou em comunicado enviado à agência Lusa.
O porta-voz do Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP), Pedro Pardal Henriques, disse na terça-feira que se registaram três situações de troca de combustível em descargas feitas por militares das Forças Armadas e da GNR. Em declarações à agência Lusa, Pardal Henriques referiu a existência de contaminações em postos de abastecimento em Sesimbra, Peniche e Nazaré devido à troca de combustível em tanques.
O Ministério de João Gomes Cravinho adiantou que "os militares das Forças Armadas estão empenhados segundo os termos estabelecidos na portaria em que se efetiva a intervenção das Forças Armadas na requisição civil, cuja necessidade foi reconhecida pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 153, de 12 de agosto de 2019".
Antes do comunicado do Ministério da Defesa Nacional, fonte do Ministério do Ambiente afirmou à Lusa que a Entidade Nacional para o Setor Energético (ENSE) não tem conhecimento de casos de troca de combustível alegadamente efetuada por elementos das Forças Armadas ou de segurança. "A ENSE não tem conhecimento de qualquer caso anómalo de troca de combustível alegadamente efetuada na descarga nos postos de abastecimento por parte das Forças Armadas ou de segurança", declarou a fonte do Ministério do Ambiente e da Transição Energética, esclarecendo que estas autoridades são apenas responsáveis pelo transporte do combustível.
Requisição civil partiu a geringonça
Horas depois de o governo ter decretado oficialmente requisição civil para a greve dos motoristas de matérias perigosas, os comunistas reagiram, em comunicado, dizendo que esta medida do governo introduzia "limitações ao direito à greve". "Independentemente da evolução verificada, o PCP salienta que a resposta aos problemas, que se mantêm, exige o desenvolvimento da luta consequente, acompanhada de uma negociação coletiva que resolva os problemas e reafirma a defesa do efetivo exercício do direito à greve", comentavam os comunistas.
A Fectrans - a estrutura sindical, próxima do PCP, que não se associou à greve -, O PCP refere que negociou com os patrões (Antram) um contrato coletivo de trabalho vertical, que "deu resposta a algumas das justas aspirações dos trabalhadores", mas "a violação dos seus termos por parte de entidades patronais gerou um legítimo descontentamento dos trabalhadores".
Já para o Bloco de Esquerda "decretar a requisição civil a pedido das entidades empregadoras é um erro e é uma limitação do direito à greve", Catarina Martins, falando com jornalistas à margem de uma visita ao centro de reabilitação Rovisco Pais, na terça-feira, afirmou que o governo deveria "exigir que todas as partes se sentem em negociações sem pré-condições".
O que reivindicam?
Os sindicatos em greve - Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas e o SIMM (Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias) - pretendem um acordo para aumentos graduais no salário-base até 2022: 700 euros em janeiro de 2020, 800 euros em janeiro de 2021 e 900 euros em janeiro de 2022, o que, com os prémios suplementares que estão indexados ao salário-base, daria 1400 euros em janeiro de 2020, 1550 euros em janeiro de 2021 e 1715 euros em janeiro de 2022. No entanto, num plenário com associados, no sábado, em Aveiras de Cima, o presidente do SNMMP, Francisco São Bento, disse que os sindicatos já exigem 900 euros de salário-base já em janeiro de 2020.
Fonte: Diário de Notícias