Ministério da Justiça atrasa plano para salvar empresas da falência
Primeiro veio a revisão do código das insolvências e, em simultâneo, a criação do Revitalizar, para aumentar o número de casos de recuperação de empresas em dificuldades
Hoje, com o arranque de um novo mecanismo extrajudicial de negociação de dívidas, será dado o terceiro passo pelo Governo na promessa que fez à troika de travar o número de falências em Portugal. Porém, falta ainda uma medida de fundo, que está nas mãos do Ministério da Justiça. Trata-se da revisão dos estatutos dos administradores judiciais, a quem cabe acompanhar estes casos.
Quando o executivo anunciou esta revolução legislativa, que teve também impactos na reprogramação do Quadro Estratégico de Referência Nacional, foi apresentado ao país um pacote de medidas, a arrancar em simultâneo, pelo grau de complementaridade que têm. Sem novo código das insolvências, o Revitalizar não teria sido consagrado nessa lei. Sem o mecanismo que hoje entra em vigor, o Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (Sireve), não haveria, fora dos tribunais, uma solução mais ágil e eficaz. E, sem a revisão dos estatutos dos administradores judiciais, continua a haver falhas no acompanhamento dos processos.
Só quando este trabalho estiver concluído é que será possível admitir mais profissionais para acompanhar processos de insolvência e de revitalização. Hoje, são pouco mais de três mil para mais de dez mil processos por ano (dados de 2011). Além disso, os novos estatutos trarão mais transparência na sua nomeação pelos tribunais, implantando um sistema de escolha aleatório que está prometido desde 2004. E o seu trabalho será remunerado em função do desempenho na viabilização de empresas em dificuldades financeiras.
Contactado pelo PÚBLICO, o Ministério o Ministério da Justiça referiu que "o anteprojecto no qual se regula o estatuto dos administradores judiciais foi já enviado" pela tutela "para consultas, tendo nesse contexto sido recebido um conjunto de contributos que se encontram em análise". Deverá estar concluída "em Setembro", adiantou fonte oficial, acrescentando que o diploma será posteriormente "sujeito ao processo legislativo conducente à sua aprovação". É, por isso, "ainda prematuro indicar uma data para que possa entrar em vigor", concluiu, recusando-se a avançar mais pormenores pelo facto de "estar em análise o processo de consultas".
Recuperar sem tribunais
O mecanismo que hoje entra em vigor, e que vem substituir o Procedimento Extrajudicial de Conciliação (PEC), é uma espécie de terceira via para as empresas em dificuldades, para além da insolvência e do programa Revitalizar, que obrigam a entrada de processos em tribunal. Na prática, permite aos devedores sentarem-se à mesa com os credores para negociar um plano de recuperação, com a intermediação do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas (Iapmei).
A revisão do PEC aconteceu por dois motivos: era necessário aumentar a adesão a este mecanismo e fazer alterações que permitissem dar mais rapidez à viabilização das empresas. O secretário de Estado do Empreendedorismo, Competitividade e Inovação, Carlos Oliveira, explicou ao PÚBLICO que, de entre as principais mudanças, está "a redução do prazo para concluir o processo negocial, que passou de nove para três meses, com possibilidade de extensão por mais um mês". Além disso, "foram introduzidos mecanismos de protecção dos devedores e dos credores, como o facto de ficarem suspensas todas as acções judiciais [execuções, por exemplo] e proibidas as alienações de património", acrescentou.
Comparando com o anterior mecanismo, haverá uma simplificação dos procedimentos, a começar pelo facto de os processos passarem a dar entrada no Iapmei através de uma plataforma electrónica. O Estado, que é normalmente um dos credores envolvidos nestes casos, "passará a estar envolvido nas negociações desde o início" e, do lado da banca, haverá um interlocutor único.
Desde 2006, foram movidos 1618 processos ao abrigo do PEC. Desses, 176 entraram no Iapmei este ano. O objectivo de Carlos Oliveira é que, até ao final de 2012, o número "supere os valores anuais registados até aqui", fruto do arranque do Sireve. Já o número de acordos alcançados atingiu, desde 2006, um total de 540, ou seja, cerca de um terço dos casos registados.
Carlos Oliveira justificou o facto de este mecanismo só agora entrar em vigor, mais de três meses depois da revisão do código das insolvências e do arranque do Revitalizar, com o facto de "ser um processo que obrigava a fazer mudanças" e que, por isso, "teve de percorrer o seu próprio caminho". Além disso, enquanto o Sireve não avançou, o PEC manteve-se disponível. Em relação ao atraso na revisão dos estatutos dos administradores judiciais, o secretário de Estado afirmou que "estão a ser dados passos importantes", recusando-se a fazer mais comentários por se tratar de um assunto que "está com o Ministério da Justiça".
Fonte Público