Suíça, França e Alemanha investigam Monte Branco
A operação Monte Branco, que desmantelou as maiores redes de branqueamento de capitais a operar em Portugal, já provocou a abertura de um inquérito judicial na Suíça, por iniciativa do Ministério Público deste país – soube o SOL junto das autoridades helvéticas
Também na Alemanha e em França – onde Michel Canals já estava referenciado noutros processos de branqueamento –, as autoridades confirmaram ao SOL que vão pedir ao Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) elementos sobre a actividade do empresário suíço, para poderem cruzar com as informações que já possuem.
Entretanto, na sequência das buscas efectuadas há duas semanas e lideradas pelo procurador Rosário Teixeira, foram já apreendidas as contas no BCP e no BPN de Francisco Canas (conhecido por ‘Zé Medalhas’), o intermediário das duas redes. Foi igualmente ‘congelada’ a conta bancária central do esquema de branqueamento de capitais que este arguido tem no BPN Instituição Financeira Internacional (IFI), com sede em Cabo Verde. Aqui está depositado cerca de um milhão de euros, pertencente a vários clientes de ‘Medalhas’.
Cerca de 400 clientes
Em causa estão cerca de quatro centenas de clientes que aderiram à fraude proposta pelas duas redes de branqueamento de capitais e que aproveitavam o BPN IFI. Recorde-se que este pertence ao Estado português (ao grupo Parpública), mas na prática é utilizado pelo BIC, que adquiriu o BPN.
Foi também na agência do BIC/BPN em Queluz que, há duas semanas, no decurso das buscas efectuadas, uma das equipas lideradas pelo juiz de instrução Carlos Alexandre apanhou ‘Zé Medalhas’ em flagrante quando se dirigia para os cofres do banco. Ia buscar cerca de 450 mil euros em dinheiro vivo que aí acumulara, para entregar aos elementos das redes que se encontravam em Portugal, fazendo a respectiva entrega aos seus clientes.
O BIC, entretanto, e apesar de o BPN IFI pertencer ao Estado, acabou por dar autorização ao arresto da conta bancária de ‘Medalhas’ em Cabo Verde. Para isso, difundiu por todos os funcionários do banco uma ordem a proibir qualquer operação financeira através daquela conta.
Mas a falta de experiência da nova administração fez com que esta se excedesse, para cumprir de forma zelosa o pedido dos investigadores. Segundo fonte daquela instituição, «até o despacho judicial que ordenou a apreensão da conta foi junto à minuta difundida por todas as agências».
Esquema muito antigo
Ainda não está apurado se o esquema agora desmantelado era uma estratégia do UBS (Union de Banques Suisses) ou se a actividade criminosa era só da responsabilidade dos seus funcionários – à época, Michel Canals, director do banco em Genebra, e Ricardo Arcos, director da instituição em Portugal.
No entanto, para a equipa liderada por Rosário Teixeira, coadjuvado pela Inspecção Tributária e pela Unidade de Acção Fiscal da GNR, o esquema já dura há mais de 30 anos. Recorde-se que a estimativa é a de que o Estado tenha sido lesado em cerca de mil milhões de euros nestes anos.
Certo é que o UBS é a peça-chave e ‘Zé Medalhas’ o pião mais antigo. Até 2005, era através de uma conta sua no banco suíço que circulava o dinheiro.
Os clientes já tinham o capital não declarado em Portugal oculto em bancos suíços e, através de transferências directas, colocavam-no na conta de ‘Zé Medalhas’ no UBS. Este encarregava-se de enviar o dinheiro para uma conta sua no BCP, em Portugal. Também o BCP terá, por isso, de responder perante os investigadores.
A partir de 2005, com ‘Zé Medalhas’ na mira do Banco de Portugal por falta de licença para operar a casa de câmbios que herdara do pai, o modo de actuação da rede mudou. Passou a utilizar também o BPN, de Oliveira Costa, e o BPN IFI.
Até aí, tanto Michel Canals como Ricardo Arcos funcionavam em conjunto e apenas o circuito de circulação do capital mudou, com o recurso ao BPN IFI. Foi a partir de 2008, com a crise a dominar o mundo económico-financeiro, que o UBS rescindiu com centenas de funcionários, entre eles os actuais arguidos na operação Monte Branco. E foi também nessa altura que Canals e Ricardo Arcos se separaram, abrindo cada um a sua empresa. Canals fica à frente da Akoya Asset Management, e Arcos lidera a Arcofinance, ambas sediadas em Genebra, dividindo entre ambos a lista de clientes angariados ao longo dos anos e mantendo ‘Medalhas’ como intermediário.
Oficialmente, essas empresas geriam e faziam aplicações de fortunas de clientes portugueses, mas na realidade agenciavam clientes e actuavam comos seus testas-de-ferro, criando empresas offshore nas quais era colocado o capital, em manobras de branqueamento e fuga ao fisco.
Fonte: Sol