Governo dá alívio fiscal em sede de IRS para salários entre 760 e mil euros
Proposta altera mecanismo do mínimo de existência para antecipar eventuais reembolsos no ano seguinte. Indemnização por despedimento sobe de 12 para 14 dias por ano.
Salários entre os 760 euros, a remuneração mínima garantida proposta pelo governo para 2023, e os mil euros vão descontar menos IRS no próximo ano, beneficiando de um rendimento disponível superior no final do mês, segundo a nova versão da proposta de Acordo de Competitividade e Rendimentos apresentada ontem a sindicatos e patrões, numa reunião extraordinária da comissão permanente da Concertação Social que contou com a presença da ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, do ministro das Finanças, Fernando Medina, e do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes.
Para aumentar o rendimento disponível deste escalão de rendimentos, entre os 760 e mil euros, o executivo propõe-se a reformular "as regras de funcionamento do mínimo de existência para conferir maior progressividade ao IRS, passando de uma lógica de liquidação a final para uma lógica de abatimento a montante, beneficiando os rendimentos até mil por mês e eliminando a distorção atual de tributação a 100% dos rendimentos imediatamente acima da atual remuneração mínima garantida", lê-se no documento a que o DN / Dinheiro Vivo teve acesso. Na prática, significa que eventuais reembolsos em sede de IRS que os trabalhadores pudessem receber, no ano seguinte, na altura da liquidação do imposto, serão já acomodados nos vencimentos mensais, por via de uma redução do IRS. Para além disso, o governo sugere que não se tributem a 100% rendimentos logo acima do salário mínimo, por exemplo, de 765 ou 770 euros, para que, no final, não fiquem abaixo do remuneração mínima.
Neste momento, o mínimo de existência, isto é, o patamar até ao qual os rendimentos estão isentos de IRS, é verificado no ano seguinte, no momento da liquidação. O executivo quer agora adiantar esse apuramento de modo a ter reflexo nos vencimentos dos trabalhadores. Por exemplo, com o aumento do salário mínimo de 705 para 760 euros, o mínimo de existência a apurar em 2024 fixar-se-á em 10 640 euros brutos anuais. Ou seja, rendimentos até este valor estão isentos. Mas, por via da retenção na fonte, estes salários podem pagar imposto, que depois será devolvido pelo fisco em 2024. Com a alteração do mecanismo, em vez de receber o reembolso no ano seguinte, passa a ter mais rendimento em cada mês, ou com uma redução na retenção ou com o aumento da dedução específica que hoje está nos 4104 euros por ano por titular.
O aumento do salário mínimo dos atuais 705 para os 760 euros para 2023 representa uma melhoria da proposta inicial, uma vez que, tal como noticiou o DN/Dinheiro Vivo, a intenção do governo era garantir um adicional de 1,3 pontos percentuais para cobrir o impacto da inflação. Feitas as contas, significaria adicionar este valor ao aumento que estava projetado, de 6,4%, o que daria uma subida de 7,7% para os 759 euros. O governo dá assim um salto para os 760 euros, uma subida de 7,8%, aproximando inclusivamente o salário mínimo nacional do proposto para a função pública: 761,58 euros.
O governo mantém a meta de chegar aos 900 euros de remuneração mínima garantida em 2026, no final da legislatura e traça já o plano de aumentos salariais para os próximos quatro ano: em 2024, sobe mais 50 euros para 810 euros; em 2025, cresce 45 euros para os 855 euros; e, em 2026, a subida será igualmente de 45 euros para os 900 euros. "As valorizações salariais devem traduzir-se em ganhos efetivos no rendimento disponível dos trabalhadores", segundo a proposta de acordo de rendimentos. Deste modo, o governo compromete-se a atualizar os escalões de IRS em 5,1% "com base no critério de valorização nominal das remunerações por trabalhador, assegurando o princípio da neutralidade fiscal das atualizações salariais, com a atualização regular dos escalões de IRS". Também é proposto, sempre que possível, a "eliminação da diferença entre a retenção na fonte de IRS e o imposto devido, evoluindo para um sistema de retenção na fonte que assegure que as valorizações salariais se traduzem em ganhos líquidos mensais para os trabalhadores", lê-se no mesmo documento entregue aos parceiros sociais.
Outra das novidades que consta do documento é o aumento da compensação por cessação de contrato de trabalho de 12 para 14 dias por ano de antiguidade. Esta matéria tem sido tabu desde que, durante o período da troika, a indemnização foi reduzida de 30 dias para 12 dias. O trabalho suplementar também evoluiu, uma vez que passa a ser pago a partir das 100 horas e não das 120 como estava previsto.
Neste esforço de aumento dos rendimentos, o executivo prevê uma série de contrapartidas, até porque, segundo o presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), António Saraiva, o aumento do salário mínimo vai "representar um acréscimo de mil milhões de euros por ano para as empresas". Deste modo, o Executivo propõe que as empresas possam abater, em sede de IRC, 50% dos custos com aumentos salariais de , pelo menos, 5,1%. Para além disso, rendimentos coletáveis sujeitos a um imposto mais baixo do que os 21% duplicam de 25 mil para 50 mil euros no caso de Pequenas e Médias Empresas (PME) e empresas do interior. Acima deste teto de rendimento, aplica-se a taxa normal de 21%. A proposta de acordo prevê ainda o "alargamento da aplicação da taxa reduzida por dois anos a empresas que resultem de operações de fusão de PME".
Indo ao encontro das exigências das confederações patronais, o Executivo abre a porta a reduções seletivas das tributações autónomas cobradas às despesas da empresas. Assim, a proposta estabelece "a redução imediata de 2,5 pontos percentuais das taxas de tributação autónoma aplicáveis aos custos associados a veículos híbridos plug-in e a redução das taxas de tributação autónoma aplicáveis a veículos ligeiros movidos a Gás Natural Veicular (GNV)", segundo o documento.
Adicionalmente, "no capítulo das tributações autónomas deverá proceder-se no período do acordo, até 2026, à redução gradual da tributação em aproximadamente 10%".
Fonte: Diário de Notícias