268 gralhas adiam decisão de ida a julgamento nos Vistos Gold

Processo considerado urgente já esteve parado devido às traduções de chinês para português. Arguidos só saberão se vão a julgamento no dia 22 de abril, 15 dias depois do previsto

Nomes de arguidos trocados, cidades na China mal escritas, datas relativas a factos que afinal não eram aquelas, vírgulas mal colocadas, palavras que deveriam estar a bold mas não estão ou até palavras em que foram identificados erros mas que afinal não o são. Estas e outras gralhas e lapsos de escrita - num total de 268, contados pelo DN - constam da errata à acusação enviada pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) às várias partes para justificar o atraso no processo dos vistos gold.

O documento e respetiva notificação foi entregue às partes no dia 4 de abril e determinou assim que a leitura da decisão instrutória (que determina se os arguidos vão a julgamento ou não) não seria feita quatro dias depois como estava marcada (dia 8 de abril) mas sim no dia 22 de abril. Ou seja: 15 dias depois. Duas semanas de atraso num processo que, à partida, foi considerado urgente mas já se deparou com alguns atrasos e bloqueios devido às necessárias traduções de chinês para português.

"O Ministério Público, tendo verificado a existência de vários lapsos de escrita no despacho de acusação formulado nos autos vem requerer a sua correção", como refere o documento a que o DN teve acesso. De seguida faz uma lista exaustiva das ditas gralhas, que vão mesmo ao ponto de identificar Manuel Palos - um dos principais e mais mediáticos arguidos do processo - como presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP) e não, à data dos factos, como diretor nacional do Serviços de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). Identifica ainda por várias vezes os arguidos como meros "suspeitos" e troca as datas de factos que terão ocorrido em novembro de 2013 como sendo de 2012.

A acusação do processo é de novembro de 2015 - um ano depois das detenções dos arguidos - e a instrução só foi feita em março (o debate instrutório realizou-se no dia 15). Nesse dia, o juiz de instrução Carlos Alexandre marcou para dia 8 de abril a leitura da decisão. Mas apesar de já na altura ser falada a existência desta errata, nada foi dito pelo Ministério Público. Só no dia 4 de abril é que o DCIAP enviou a notificação aos vários advogados dos arguidos. O DN tentou contactar alguns desses advogados mas sem sucesso.

Mas este caso, à partida, pode mesmo ser considerado insólito. Um advogado admitiu ao DN que "em mais de 20 anos de advogado de contencioso, não me recordo de qualquer outro caso desta natureza".

No debate instrutório, o Ministério Público defendeu que este caso dos vistos gold foi apenas "uma nesga" da corrupção no Estado e que os arguidos devem ir todos a julgamento, segundo disse a procuradora Susana Figueiredo. Contrariando assim a posição da defesa de António Figueiredo. A defesa de Figueiredo alegou que a investigação era nula porque o ex--presidente do IRN tinha sido surpreendido com alguns dos crimes que lhe tinham sido imputados. Segundo a acusação, António Figueiredo é acusado de 12 crimes.

Manuel Palos foi acusado de um crime de corrupção passiva e dois de prevaricação. Miguel Macedo foi acusado de três crimes de prevaricação de titular de cargo político e ainda um crime de tráfico de influência. António Figueiredo foi o arguido que mais tempo esteve em preventiva.

O caso dos vistos gold conta com 17 arguidos - alguns de nacionalidade chinesa - incluindo o ex-ministro da Administração Interna Miguel Macedo, o ex-diretor nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras Manuel Palos, o ex-presidente do Instituto de Registos e Notariado António Figueiredo e a ex-secretária-geral do Ministério da Justiça Maria Antónia Anes. Em causa a aquisição irregular destas autorizações de residência com a consequente investigação de indícios de corrupção ativa e passiva, recebimento indevido de vantagem, prevaricação, peculato de uso, abuso de poder e tráfico de influência.

Fonte: Diário de Notícias