Comissão quer fiscalizar automóveis que já estejam a circular

Proposta de regulamento alarga poderes comunitários e segue agora para o Parlamento Europeu e o Conselho. As penalizações para os fabricantes poderão ir até aos 30 mil euros por veículo.

A Comissão Europeia propôs um conjunto de regras mais apertadas para a avaliação das emissões poluentes dos automóveis, com o objectivo de dar às autoridades comunitárias mais poderes de fiscalização, incluindo o controlo de carros que já estão a circular nas estradas. Entre as várias medidas propostas no projecto de regulamento, divulgado nesta quarta-feira, estão multas que podem chegar aos 30 mil para os fabricantes que não cumpram as regras.



A proposta surge na sequência do escândalo da Volkswagen, cuja fraude nos testes de emissões de poluentes foi descoberta em Setembro, intensificando a pressão (incluindo por parte do Parlamento Europeu) para que o sector fosse mais escrutinado. Este projecto de regulamento – que a Comissão classifica como uma “revisão total” do sistema de homologação de veículos – tem agora de passar pelos dois orgãos legislativos da União, o Parlamento Europeu e o Conselho, num processo que poderá ser moroso e ao longo do qual as propostas poderão sofrer alterações.

Uma das novidades propostas pela Comissão é a alteração do sistema de pagamento dos testes dos automóveis. Actualmente, estes exames são pagos directamente pelos fabricantes de veículos aos serviços que os executam, algo que a Comissão considera poder “levar a um conflito de interesses e comprometer a independência dos ensaios”. O objectivo é que os estados-membros criem um sistema de taxas, a pagar pelos fabricantes, para custear os testes, evitando uma ligação financeira directa entre as marcas automóveis e os serviços técnicos.

O projecto de regulamento prevê também “critérios de desempenho mais rigorosos” para aqueles serviços técnicos, que deverão passar a ser auditados regularmente. Da mesma forma, as autoridades nacionais responsáveis pela homologação de automóveis também serão avaliadas pelas autoridades dos restantes países, “para assegurar que são aplicadas as regras pertinentes e cumpridas de forma rigorosa em toda a EU”.

Os veículos em circulação poderão também vir a ser testados por autoridades europeias – uma medida que vem reforçar os poderes comunitários. “Embora as regras actuais lidem principalmente com controlos efectuados antes de os veículos saírem para o mercado, no futuro, os Estados-membros e a Comissão procederão a controlos por amostragem em que verificarão a conformidade dos veículos que já se encontram no mercado”, explica um comunicado. Estes testes por amostragem começaram recentemente a ser feitos em França, tendo as autoridades descoberto valores de emissões poluentes maiores do que o comunicado ao público em, pelo menos, um modelo da Renault, embora dentro dos limites legais.

Hoje, a avaliação feita num país é válida em toda a União Europeia, mas a Comissão pretende que os estados-membros tenham “a possibilidade de impor medidas de salvaguarda contra veículos não conformes no seu território, sem ter de esperar que seja a autoridade que emitiu a homologação a tomar medidas”.

O projecto ainda pretende reforçar os poderes de supervisão europeia. A Comissão poderá “suspender, restringir ou retirar a nomeação” dos serviços de testes “cujo desempenho seja considerado insuficiente e que são negligentes na aplicação das regras”. Terá também a possibilidade de realizar inspecções mesmo depois de um veículo já ter passado os testes e “se necessário, pôr em marcha uma retirada de veículos do mercado”. As penalizações para os fabricantes poderão ir até aos 30 mil euros por veículo, caso não tenha havido sanções aplicadas pelas autoridades nacionais.

Por fim, a proposta pretende que as autoridades recebam mais informação por parte dos fabricantes sobre o software que instalam nos veículos, uma medida que se destina a evitar evitar manipulações semelhantes à que a Volkswagen fez. Também obriga as empresas a revelarem os seus planos para a redução de emissões.

A Comissão disse que o sector precisa com urgência de novas regras e que espera um acordo no Parlamento e no Conselho (que reúne os Estados-membros a nível ministerial) “assim que o processo legislativo o permita”, mas não estabeleceu qualquer objectivo em termos de datas. Uma vez aprovado o regulamento, este entrará imediatamente em vigor, não precisando de ser transposto para as legislações nacionais.

“Num mercado único, onde as mercadorias circulam livremente, todos têm de cumprir as regras”, observou o finlandês Jyrki Katainen, vice-Presidente responsável pelo Emprego, Crescimento, Investimento e Competitividade. “As revelações da Volkswagen sublinharam que o sistema que autoriza a colocação dos veículos no mercado tem de continuar a ser melhorado. Para recuperar a confiança dos consumidores neste importante sector, temos de apertar as regras, mas também assegurar-nos de que estas são efectivamente respeitadas.”


Fonte: Público