Novo regime de protecção especial na invalidez chegará a entrar em vigor?

Bloquistas querem travar decreto-lei que acaba com lista de doenças crónicas e faz depender apoio de prognóstico de dependência ou morte no prazo de três anos.

É a primeira iniciativa parlamentar de Jorge Falcato, o primeiro deputado com deficiência física eleito para a Assembleia da República: tentar impedir a entrada em vigor do decreto-lei que altera o acesso ao regime de protecção especial na invalidez, que extingue a lista de doenças crónicas e incuráveis susceptíveis de apoio especial. O assunto será debatido quinta-feira no plenário.



O regime especial abrange pessoas muitas vezes ainda jovens e com uma carreira contributiva curta, com doenças que depressa podem conduzir a situações de dependência e de incapacidade permanente para o trabalho. De acordo com a legislação ainda em vigor, só se consideram doentes com paramiloidose familiar, doença de Machado/Joseph, VIH/sida, esclerose múltipla, esclerose lateral amiotrófica, doença de foro oncológico, Parkinson e Alzheimer.

O Decreto-Lei n.º 246/2015, publicado em Outubro, acaba com aquela lista de oito doenças. O acesso à protecção especial deixa de depender da patologia, passa a contar o impacto na vida laboral de uma pessoa. O que tem gerado polémica? Além de estar numa situação de incapacidade permanentemente para trabalhar, a pessoa tem de ter prognóstico de “dependência ou morte num período de três anos”.

“A decisão foi tomada pelo anterior Governo sem ouvir os representantes das pessoas com doenças crónicas”, afiança o deputado bloquista. Apesar dos diversos pedidos, o BE nunca teve acesso à composição da comissão especializada e ao seu relatório, documento em que se baseou a decisão do Governo PSD/CDS.

Na sexta-feira, em audição pública, no Parlamento, Falcato recolheu opiniões de representantes de associações de pessoas com diversas doenças crónicas – ataxias, VIH/sida, espondilite anquilosante, Parkinson, poliomielite, fibromialgia, esclerose múltipla, cancro do intestino, doenças neuromusculares, diabetes, esclerose lateral amiotrófica... E “todas” lhe disseram que o decreto-lei deve ser revogado antes de entrar em vigor, a 1 de Janeiro, e que a anterior legislação precisa de ser melhorada.

Não é só a redacção do decreto, que tem sido contestada inclusive pelo bastonário da Ordem dos Médicos (OM), José Manuel Silva, segundo o qual os médicos não podem fazer tais prognósticos. É também a metodologia usada para apurar o grau de incapacidade, explica o deputado.

Ao longo das duas horas de audição, diversas vezes Jorge Falcato ouviu dizer que é desadequada a Tabela Nacional de Funcionalidades, que será usada, a título experimental, nas peritagens. Pode acontecer que um doente em estado grave seja dado como capaz, desde que fale, ande, se vista e se lave, já explicou ao PÚBLICO Paulo Silva Pereira, da TEM - Associação de Todos com a Esclerose Múltipla.

O que deseja, para já, é parar este processo, impedir a entrada em vigor do decreto-lei – a decisão será tomada sexta-feira pela Assembleia da República. Se conseguir, quer reiniciar um outro, que lhe permita encontrar “uma solução adequada”. E essa teria de ser encontrada, mas poderia passar por rever o método de apurar o grau de incapacidade e/ou por alargar a lista de doenças. Curiosamente, a comissão em que se baseou o Governo chegou a ponderar criar uma nova lista com 21 grupos de doenças, como a artrite reumatóide, as insuficiências respiratórias, renais e hepáticas, mas afastaram esta possibilidade.

Fonte: Público