Coligação lança escada para um pacto na Justiça dez anos depois

Ordem dos Advogados recebeu forças políticas para debater o programa eleitoral: oposição critica mapa judiciário e defende redução das taxas judiciais. Coligação quer acordo.

O tema mais tabu desta campanha eleitoral - o que se quer nos próximos quatro anos para a pasta da Justiça - foi ontem cautelosamente abordado pela primeira vez.
"Há razões para fazer um esforço para nos entendermos, um grande esforço para um consenso das forças políticas que se traduz numa disponibilidade grande para a renovação da Justiça". As palavras são de Filipe Anacoreta Correia, que ontem abriu as portas para a possibilidade de um novo acordo para a Justiça, dez anos depois do pacto assinado entre PSD e PS em tempos de maioria absoluta de José Sócrates, em 2005.
O democrata-cristão falava no debate (inédito) organizado pela Ordem dos Advogados (OA), que decorreu na sede, em Lisboa. E com um mote predefinido: conhecer os programas eleitorais na área da Justiça de todos os partidos candidatos ao acto eleitoral de 4 de outubro. Um consenso na Justiça que não recebeu feed-back , pelo menos aparente, de João Tiago Silveira, ex-secretário de Estado da Justiça do governo socialista e que esteve no encontro em representação do PS.
Passando à margem da escada lançada por Anacoreta Correia, João Tiago Silveira, o homem do "Simplex" e da modernização da Justiça, apontou antes baterias para a necessidade urgente de uma Justiça rápida e mais bem gerida. Para isso, subscreveu a "necessidade de realização de contratos públicos pelas entidades responsáveis pela Justiça", no sentido de uma maior transparência.
Recusou que os problemas da Justiça se resolvem com mais meios (humanos neste caso) e não se comprometeu quanto ao mapa judiciário. "Temos de remendar alguns erros e ver caso a caso em termos de afastamento das populações aos tribunais", Prometeu ainda um novo sistema informático - a que chamou "uma nova ferramenta"- que faça esquecer o bloqueio do Citius que marcou o arranque do novo mapa judiciário.
A CDU, representada pelo deputado João Oliveira, defendeu que tem de se garantir o acesso à Justiça, evitar "a governamentalização" da mesma e recusou que a fórmula mágica para os tribunais estará no "consenso" falado por Filipe Anacoreta Correia. Fugindo um pouco ao tema discutido no Largo de São Domingos, em Lisboa, João Oliveira deixou o recado: "espero que se entendam quanto à paternidade da troika".
Pelo Bloco de Esquerda (BE), Helena Pinto garantiu que em Portugal "há uma justiça para os pobres e outra para os ricos". Apelidando o balanço de quatro anos de Paula Teixeira da Cruz como "trágico e que não deixou ninguém satisfeito: acaba-se esta legislatura com uma ministra isolada", concluiu. Quanto ao programa eleitoral bloquista, as setas apontam para uma correção dos erros do mapa judiciário, com a criação de "tribunais de competência genérica para todos , criação da figura do defensor público e uma justiça tendencialmente gratuita".
A bastonária dos advogados recusou a ideia que o debate por si organizado "politiza a Justiça". E acrescentou, perante a plateia de advogados de todo o país: "sentimos a necessidade de elucidar quais as propostas na Justiça por parte dos partidos", quebrando assim o longo silêncio que reinou nesta matéria. Certo é que, da parte dos partidos com assento parlamentar, o nome José Sócrates não foi referido.
Ontem, em campanha, o deputado do PSD, Carlos Abreu Amorim, cabeça de lista por Viana do Castelo, considerou uma "coisa estranhíssima" que até aqui PS não tenha falado em medidas para a Justiça. "Durante toda a legislatura o PS disse que ia revogar a reforma que o governo tinha feito na Justiça, mas agora calou-se. Provavelmente chegou à conclusão que, tal como nós, as medidas tomadas, desde o novo mapa judiciário às diversas alterações em matéria penal e administrativa, por exemplo, foram positivas", acrescentou.
O social-democrata garantiu que não há "qualquer receio" de que as investigações que envolvem figuras de destaque do PSD, como Miguel Macedo ou Marco António Costa, possam ser usadas pela oposição.


Fonte: Diário de Notícias