Cotadas vão ter código societário único dentro de poucos meses

Códigos de boas práticas societárias da CMVM e do IPCG vão dar origem a documento comum de referência.

Está em curso a fusão dos códigos de governo societário da CMVM e do Instituto Português de Corporate Governance (IPCG), acabando com a liberdade de escolha que as cotadas usufruíam até aqui.

Actualmente, as empresas têm de seguir um dos códigos, escolhendo qual deles preferem tomar como referência e, depois, informando que recomendações cumprem do código adoptado. No entanto, esta liberdade de escolha não foi valorizada pelas cotadas. Um levantamento feito pelo Diário Económico é claro: das 38 cotadas que já divulgaram o seu relatório de governo societário relativo a 2014, nem uma optou por tomar o código do IPCG como referência. Este foi criado no início de 2013, como forma de dar às empresas uma alternativa ao código da CMVM, como corolário do princípio da auto-regulação emanada da sociedade civil. No entanto, dois anos depois, o resultado está à vista.

"A minha leitura do processo é que não se verificou uma fraca adesão das sociedades emitentes de valores em mercado regulado, o que se observou, na verdade, foi ausência de formalização dessa adesão", explica Manuel Agria, vice-presidente do IPCG, em declarações ao Diário Económico. Os motivos apontados são vários. Por um lado, a própria CMVM alterou o seu código em 2013, aproximando-o mais das posições defendidas pelas empresas, nomeadamente através da AEM, associação que reúne as cotadas e que tem estado muito interventiva nestes processos. Esta maior flexibilidade do código da CMVM "acaba por determinar uma menor pressão por parte destes no sentido de se avançar, com urgência, para a elaboração de um código alternativo e a adopção de uma atitude de ‘wait and see' na tomada de decisão quanto à adesão ao código do IPCG; não podemos ignorar que a paternidade de um dos dois códigos existentes - o da CMVM - pertence ao regulador do mercado, o que torna compreensivelmente mais problemática a opção pela alternativa", explica a mesma fonte. Por outro lado, lembra Manuel Agria, a eclosão dos casos BES e PT veio trazer mais atenção às matérias do ‘corporate governance' e sugeriu a introdução de novas regras no futuro, pelo que "cresceu entre os emitentes a convicção de que seria mais aconselhável aguardar pela estabilização do processo".

Nos últimos meses tem havido uma aproximação das duas entidades, CMVM e IPCG, para que deixe de haver os dois códigos, até porque um deles não tem seguidores. "De facto está em curso um processo que poderá conduzir à adopção de um código unificado e a um processo de avaliação comum, caso as duas instituições cheguem a um acordo", revela ao Diário Económico fonte oficial da CMVM, que acrescenta que "neste momento ainda não é possível antecipar o desfecho", mas que esperam "que seja positivo". Manuel Agria é mais concreto, revelando optimismo até no calendário. "O processo está em fase adiantada de execução, procedendo-se, nestes dias, à avaliação das propostas de solução apresentadas para integrarem o futuro documento; a expectativa do IPCG é de que este processo possa estar concluído até ao final do terceiro trimestre deste ano", explica.

Na prática, quando tal acontecer, o que muda é apenas a liberdade de escolha. Passa a haver apenas um conjunto de recomendações, unificadas num código, ao qual as empresas devem comparar-se. Tratando-se de recomendações (em matérias como a divulgação de remunerações e independência de administradores, entre muitas outras), o seu cumprimento não é nem será obrigatório. As cotadas terão, como até aqui, obrigação de divulgar um relatório anual de ‘governance', elencando as recomendações do código de referência e revelando quais as que são cumpridas e, nas que não são cumpridas, o motivo por trás desse não cumprimento.

Fonte: Diário Económico