Incentivo das facturas tem de sofrer ajuste para gastos de saúde e educação

Para o benefício fiscal no IRS abranger facturas de todo o tipo de despesa de saúde e educação, o Governo terá de fazer alterações. Com um quociente familiar e deduções fixas, impacto das mudanças no IRS será distinto.

A sugestão do grupo de peritos fiscais para que o Governo estude uma forma de incluir as despesas de saúde e educação no benefício fiscal em sede de IRS pode obrigar o executivo a adaptar este sistema de incentivos, para quem pede facturas com o número de contribuinte.

Isto porque o regime destes benefícios determina que ao IRS possa ser abatida uma pequena parte (15%) do IVA suportado pelos consumidores em compras e serviços prestados, em quatro sectores de actividade – restaurantes, hotelaria, cabeleireiros e oficinas de reparação automóvel. E, actualmente, as prestações de serviços médicos e de ensino estão isentas de IVA. Sem alterações, ficariam de fora do incentivo das despesas com consultas médicas e os gastos com prestações em jardins-de-infância, por exemplo.

Se a opção do Governo for a de considerar todas as facturas emitidas neste tipo de gastos, terá de adoptar uma taxa única para as despesas de saúde e educação. No projecto final da comissão de reforma, o grupo de peritos fiscais refere precisamente que, para incluir estes dois novos sectores no incentivo ao pedido de facturas, possam ser precisas adaptações.

Para Luís Leon, fiscalista da Deloitte, “como algumas despesas são isentas de IVA, o que a comissão de reforma está a sugerir é que o Governo adapte o regime para incluir tudo, para que as prestações de serviços médicos e de ensino também beneficiem”.

Nesse cenário, avança, uma alternativa seria criar a tal taxa única definida em função da despesa realizada, aproximando-a do benefício fiscal que resulta do abatimento à colecta do IRS dos 15% do IVA suportado em despesas nos cabeleireiros, restaurantes, hotelaria e mecânicos. “Por exemplo, o benefício no IRS seria equivalente a 5% das despesas de saúde e educação”, exemplifica Luís Leon.

Actualmente, o tecto máximo do benefício fiscal para quem pede facturas com Número de Identificação Fiscal (NIF) nos quatro sectores vai até aos 250 euros. Para usufruírem do incentivo máximo, é preciso acumular despesas de cerca de 750 euros por mês, perto de 9000 euros anuais.

A comissão de reforma do IRS, liderada pelo fiscalista Rui Duarte Morais, propõe, ao mesmo tempo, que passe a haver um sistema de deduções fixas à colecta do IRS para as despesas em educação, saúde e habitação e deduções pessoalizantes. No modelo proposto pelo grupo de trabalho, as deduções não variam em função do gasto efectivamente realizado, mas passam a ser iguais por cada sujeito passivo, dependente e ascendente, num valor a definir pelo Governo.

A proposta de deduções fixas e iguais para todos gerou críticas entre alguns fiscalistas. Foi o caso de Carlos Lobo, fiscalista da EY e ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de Teixeira dos Santos, que veio alertar para o facto de o “cunho pessoal” do imposto diminuir.

Esta opção corre em paralelo com outra mudança proposta pelos dez peritos fiscais: a introdução de um quociente familiar, em que cada membro do agregado familiar conta para se determinar o rendimento colectável. Neste quociente, para além do número de sujeitos passivos, quando se divide o rendimento é dada uma ponderação de 0,3 pontos por cada filho ou ascendente a viver na mesma casa e com um rendimento até 259,4 euros, valor da pensão mínima).

IRS pode aumentar para algumas famílias
Conjugando o quociente familiar proposto com o regime de deduções fixas, é certo que há casos em que se verifica uma redução do IRS a pagar, mas outros há em que o imposto aumentará. Tudo vai, no entanto, depender daquilo que for a opção do Governo, nomeadamente porque os tectos das deduções fixas ainda não são conhecidos. Há três cenários equacionados pela comissão de reforma: um em que o executivo decide não compensar a perda de receita causada pela introdução do quociente familiar; outro em que se compensa toda a receita “perdida”; e um cenário intermédio em que as deduções foram fixadas de forma a que a perda de receita seja de apenas metade.


As simulações feitas para o PÚBLICO pela consultora PwC, que têm por base este cenário intermédio, mostram que em alguns casos os contribuintes podem vir a pagar mais IRS do que actualmente. É caso de uma família com baixos rendimentos (25.200 euros brutos por ano), com um filho e com um ascendente a cargo (um avô ou avó com baixos recursos e que viva na mesma casa, por exemplo).

Este ano, o rendimento líquido seria de 24.455,28 euros anuais; o IRS a pagar era de 744,72 euros. Aqui aplica-se o quociente conjugal em vigor e despesas de saúde, educação e gastos com imóveis (empréstimos) num total de 1900 euros. Em 2015, aplicados o novo quociente familiar e o sistema de deduções fixas (no cenário intermédio), o imposto final a pagar aumentaria para 889,1 euros, baixando o rendimento líquido para 24,310,9 euros. Segundo a simulação da PwC, há um agravamento do IRS de 114 euros.

O inverso acontece se o mesmo agregado familiar tivesse um rendimento bruto de 44.800 euros: o imposto final este ano era de 6200,72 euros; no próximo ano, cairia 4%, para 5913,98 euros. Se for simulada a mesma composição familiar, mas com um rendimento de 62.800 euros, o imposto a pagar este ano é de 12.308,04 euros, o que daria um rendimento líquido de 50.491,96 euros. Já em 2015, o IRS a pagar diminui para 11.134,3 euros.

Sobretaxa desce com subida do salário mínimo
Outra questão que ainda está em aberto é a redução da sobretaxa de 3,5% de IRS, um tema que só deverá ser respondido quando o executivo apresentar a reforma do IRS, até à véspera de entregar o Orçamento do Estado para 2015 no Parlamento.

Para já, independentemente da decisão que o Governo tomar, a subida do salário mínimo para os 505 euros tem já este mês um impacto imediato na retenção na fonte da sobretaxa. Isto porque os 3,5% incidem sobre o rendimento englobado na declaração de IRS subtraindo o valor do salário mínimo.

Este ano, a sobretaxa foi sendo calculada durante nove meses tendo por base o valor do rendimento colectável que excedia um salário mínimo de 485 euros; nos últimos três meses do ano, é aplicada tendo em conta os 505 euros que vigoram desde 1 de Outubro. É esse o valor que será tido em conta no próximo ano. A dúvida é saber se serão aplicados os 3,5%, ou menos.


Fonte: Público