MP teme fuga de procuradores da investigação criminal

Procuradora que coordena combate à corrupção diz existir risco de "fuga dos melhores". Sindicato já alertou ministra para o problema das diferenças salariais

Um procurador-adjunto que faça julgamentos de multas da ASAE e detenções por consumo de álcool vai ganhar, em média, mais 400 euros do que um colega seu que trabalhe dias e noites na investigação criminal. Esta é a consequência da entrada em vigor da Lei do novo Mapa Judiciário que classificou os juízos criminais e tribunais de pequena instância criminal como "especializados", deixando de fora da tal especialização os Departamentos de Investigação e Acção Penal.
A diferença salarial, como disse ao DN Rui Cardoso, presidente do Sindicado dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), pode levar a uma "debandada" da investigação criminal. "O problema colocou-se depois de a lei ter sido alterada no Parlamento, tornando-a injusta para os colegas que fazem investigação criminal e têm anos de experiência acumulada em certos tipos de crimes, como a corrupção e o crime violento". O SMMP reuniu no passado dia 23 de maio com a ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, a quem expôs o problema, mas ainda não obteve nenhuma garantia de que o mesmo será resolvido. "As diferenças salariais entre os colegas podem atingir os 700 euros, dependendo do índice em que se encontrem", reforçou ainda Rui Cardoso.
Também a procuradora Teresa Almeida, que coordena a 9ª secção do DIAP de Lisboa, especializada em crimes económico-financeiros, teme uma "fuga dos melhores" procuradores adjuntos. "Esta situação de profunda e inexplicável desigualdade, significa a desvalorização da nobre e complexa actividade de direcção da investigação criminal e de acusação que "alimenta" os tribunais de julgamento e tem, como consequência imediata, a "fuga" dos melhores", declarou a magistrada, numa declaração ao DN.
"Com a entrada plena em vigor da Lei de Organização Judiciária, os procuradores-adjuntos colocados nos Departamentos de Investigação e Acção Penal, responsáveis, por exemplo, pela
direcção da investigação e acusação de redes internacionais de tráfico de pessoas e de droga, de crimes de manipulação de mercado, de burlas e fraudes fiscais complexas e graves, de
redes de corrupção nas estruturas superiores da Administração Pública, irão receber algumas centenas de euros a menos que os seus colegas, com a mesma categoria profissional, dos tribunais de julgamento (Pequena Instância Criminal e Cível, Juízos Criminais e Cíveis)", explicou ainda Teresa Almeida, para quem esta situação "a médio e longo prazo, traduz-se no retrocesso de dezenas de anos na investigação da criminalidade cada vez mais complexa"
"Este não é, não pode ser, um problema de dinheiro. É uma questão crucial de política criminal", acrescentou a procuradora da República que coordena a 9ª secção do DIAP de Lisboa. O DN enviou um conjunto de questões ao ministério da Justiça sobre esta matéria, mas não obteve resposta.

Fonte: Diário de Notícias