Ministério Público recorre de absolvição nos submarinos

Procurador tem 60 dias para tentar junto do Tribunal da Relação de Lisboa que o caso das contrapartidas não morra hoje, depois de todos os arguidos terem sido considerados inocentes no julgamento.

Os três arguidos alemães e os sete arguidos portugueses do julgamento sobre o negócio das contrapartidas acordado entre o Estado português e o consórcio German Submarine Consortium, associado à venda de dois submarinos a Portugal em 2004, foram absolvidos esta sexta-feira por um colectivo de juiz dos crimes de fraude e falsificação de documentos. O Ministério Público, no entanto, decidiu não dar o caso por perdido e pediu um prazo especial de 60 dias para poder recorrer do acórdão para o Tribunal da Relação de Lisboa.

Perante a decisão, já esperada, dos juízes de absolver os arguidos, pelo facto de o colectivo da 6.ª vara criminal de Lisboa entender que "não resultou provada qualquer falsidade em qualquer dos documentos" apresentados pela acusação, o procurador Vítor Pinto requereu que lhe fosse concedido dois meses, em vez dos habituais 30 dias, para poder preparar um recurso em segunda instância e assim tentar que o acórdão seja anulado.

A acusação do Ministério Público tinha implicado como autores dos crimes três ex-administradores da Man Ferrostaal, empresa do consórcio alemão responsável por concretizar as contrapartidas para a economia portuguesa associadas à compra dos dois submarinos. Eram eles Horst Weretecki, Antje Malinowski e Winfried Hotten. Havia depois, no lado português, mais sete acusados, todos eles empresários ou administradores ligados a empresas nacionais de um agrupamento de componentes para a indústria automóvel, a ACECIA, que iriam beneficiar das contrapartidas fornecidas pelo consórcio alemão.

Não houve "plano criminoso"


No final, ao fim de sete anos de processo, o Ministério Público reclamava penas suspensas para os arguidos e uma indemnização de 104 mil euros a favor do Estado, apesar de ter alegado que as perdas para o Estado com os alegados crimes ascendiam a 30 milhões de euros. Mas nem isso conseguiu. Nas 620 páginas do acórdão, o colectivo liderado pela juíza Judite Fonseca explica como não deu como provado que houvesse um "plano criminoso" delineado entre funcionários da Man Ferrostaal e responsáveis da ACECIA para que fossem dados como contrapartidas no negócio dos submarinos projectos que já estariam em execução.

O tribunal concluiu que "novas encomendas" de componentes que já estavam a ser produzidos para a indústria automóvel alemã antes do contrato de contrapartidas eram válidas e não fictícias, ao contrário do que argumentava o Ministério Público. Além do mais, segundo os juízes, o Estado tinha forma de controlar o acordo e a sua execução ao longo dos anos e nunca levantou objecções às respostas que foi recebendo das empresas associadas à ACECIA. Sendo que havia uma Comissão de Permanente Contrapartidas criada pelo Estado, com técnicos para analisar o andamento do contrato.

Por outro lado, as perícias realizadas pela Inteli, uma empresa de consultores de capitais públicos, não foram tidas em conta pelo tribunal. A Inteli é a única consultora em Portugal especializada em negócios de armamento e, antes de trabalhar para o Ministério Público para ver à lupa toda a documentação relacionada com as contrapartidas entre o consórcio alemão e o Estado e produzir relatórios técnicos, tinha tido como clientes a Ferrostaal, a Escom, a ACECIA. A defesa procurou sempre chamar a atenção para um conflito de interesses por parte dos consultores. A divulgação de que havia uma relação amorosa entre o presidente da Inteli e uma das procuradoras a investigar o caso ajudou a reforçar a ideia de que as perícias não podiam ser consideradas.

Depois da leitura do acórdão, um dos advogados de defesa, João Perry da Câmara, classificou a decisão do juízes de "arrasadora" para o Ministério Público e lamentou, em declarações ao Expresso, que "tenha sido preciso esperar sete anos e que se chegasse a julgamento para se chegar a uma conclusão como esta", com todos os efeitos nefastos que o caso teve para os arguidos e para as empresas implicadas. "Perderam-se centenas de milhares de euros em negócios que ficaram suspensos por causa do processo. E as consequências também foram dramáticas a nível pessoal. Um dos meus dois clientes, por exemplo, deixou de ser administrador da empresa onde estava por causa disto".


Fonte: Expresso