Cerco ao Tribunal Constitucional. Passos ameaça com aumento de impostos

Troika deu nota positiva na décima avaliação, mas fica dependente de compensação a eventual chumbo do TC. E avisa que as novas medidas podem prejudicar crescimento e emprego.

A décima avaliação do programa de ajustamento foi positiva, mas depende da resposta do governo a um eventual chumbo do Tribunal Constitucional (TC). Na semana em que se conhece o veredicto dos juízes sobre a medida mais importante do Orçamento do Estado para 2014, a pressão é feita de dois lados: a troika diz que um chumbo constitucional e as consequentes medidas substitutivas podem pôr em causa o crescimento, o emprego e o regresso aos mercados e o primeiro-ministro já fala em aumento de impostos.

O Tribunal Constitucional tem de decidir esta semana - tudo aponta que seja conhecida a decisão na quinta-feira - sobre o regime de convergência dos sistemas de pensões, que tem um impacto líquido no Orçamento de 2014 de cerca de 400 milhões de euros. E o governo ensaiou uma jogada política de pressão em duas frentes. Ontem a troika terminou a décima avaliação e no comunicado conjunto assinala os riscos para Portugal de um chumbo. Na conferência de imprensa, tanto o vice-primeiro-ministro como a ministra das Finanças disseram que o governo cumprirá a decisão, bem como as metas e os objectivos definidos com a troika.

Na declaração conjunta da troika é dito mais. Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional afirmam que, no caso de as medidas (sobretudo a convergência dos sistemas de pensões e o corte nos salários dos funcionários públicos) serem declaradas inconstitucionais, "o governo reafirmou o seu compromisso de identificar e implementar medidas compensatórias de grande qualidade para atingir a meta do défice de 4% do PIB. Essas medidas, contudo, podem aumentar os riscos para o crescimento e o emprego e reduzir as perspectivas de um regresso sustentado aos mercados financeiros".

A questão prende-se com a definição de "grande qualidade" para a troika, o que pode indicar que o governo se tenha comprometido com medidas compensatórias do lado da despesa e não do lado da receita.

Contudo, de imediato, o governo acena com o aumento de impostos. Ou pelo menos volta a pô-lo em cima da mesa. O primeiro-ministro esteve ontem a visitar várias empresas no Norte do país e não perdeu a oportunidade de ameaçar com a possibilidade de aumentar impostos a curto prazo - apesar de dizer que o governo acredita que não vai ter de o fazer: "Podemos, a curto prazo, não ter alternativa, mas é muito mau pensar que, para o futuro, só conseguimos resolver os nossos problemas de défice aumentando os impostos" (ver página 4).

O governo nega, no entanto, ter discutido com a missão técnica qualquer plano B para um eventual chumbo. Tanto o vice--primeiro-ministro, Paulo Portas, como a ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, reafirmaram que se comprometeram com as metas estabelecidas para que o programa de ajustamento termine a 17 de Maio. "Cumpriremos as decisões do Tribunal Constitucional como cumpriremos os objectivos com a missão externa", disse Paulo Portas. Ou seja, asseguram que se comprometeram a cumprir as metas, mas não como irão fazê-lo no caso de o TC chumbar de novo normas de um Orçamento.

Aliás, os dois governantes deram ontem uma conferência de imprensa sobretudo para transmitir uma mensagem tranquilizadora para os mercados: que o défice deste ano de 5,5% "é atingível", que Portugal está a duas avaliações do fim do programa e que este será cumprido com sucesso.

Maria Luís Albuquerque garantiu até que "não é o momento de fazer revisões de metas ou de introduzir alterações ao programa". No entanto, poderá ter de o fazer no caso dos chumbos e por isso, salientou, "há alguma incerteza que permanece, que tem um preço" e que "enquanto alguns elementos não se clarificarem haverá resistência à descida das taxas". Resistência dos investidores que pode dificultar o acesso ao mercado, condição obrigatória para aceder a um programa cautelar.

Na conferência de imprensa, a ministra das Finanças disse ainda que quer fazer emissões de dívida de médio e longo prazo ainda antes do final do programa, que assegurem "se não todas, pelo menos uma parte muito significativa das necessidades" de financiamento para 2014.

Fonte: Jornal i