Estado só recebeu seis denúncias desde que a nova lei do teletrabalho entrou em vigor
Funcionários públicos têm sinalizado atrasos na comparticipação de despesas com o teletrabalho, mas à Inspeção-Geral de Finanças, a quem compete a fiscalização da aplicação da lei no sector público, são poucas as queixas que chegam
Desde 1 de janeiro de 2022 que o enquadramento jurídico do teletrabalho tem novas regras em Portugal. A alteração legislativa introduzida veio alargar o leque de potenciais abrangidos pelo regime de trabalho remoto a trabalhadores com crianças até aos 8 anos de idade, sob condições específicas, introduziu o dever de abstenção de contacto por parte do empregador no período de descanso dos trabalhadores e previu a compensação ao trabalhador pelo acréscimo de encargos decorrentes do teletrabalho. Regras que têm levantado muitas dúvidas aos empregadores, e sobre cuja aplicação os trabalhadores têm sinalizado constrangimentos, como é o caso da comparticipação de despesas. Denúncias que, no entanto, não chegam às entidades competentes pela fiscalização do teletrabalho.
Os funcionários públicos esperavam receber com o processamento salarial de fevereiro a comparticipação de despesas do teletrabalho relativa ao primeiro mês do ano, tanto mais que a Direção-Geral da Administração e do Emprego Público publicou a 11 de fevereiro um conjunto de FAQ para facilitar a aplicação da nova lei. Porém, tal não aconteceu, confirmou esta semana ao jornal digital “Eco” o líder da Federação dos Sindicatos da Administração Pública (Fesap), José Abraão.
O Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública justifica a ausência de pagamento com o facto de as faturas de janeiro só chegarem no final de fevereiro, já fora do período de processamento de salários. Mas esta não é a única queixa que chega aos sindicatos. Os funcionários públicos reportam também demora na resposta dos serviços ao pedido de teletrabalho, situação que foi recentemente confirmada ao Expresso também por José Abraão.
Seis denúncias e um pedido de parecer
Apesar disso, as denúncias que chegam à Inspeção-Geral de Finanças (IGF), a quem compete a fiscalização do cumprimento da lei do teletrabalho nos vários serviços e organismos da Administração Pública, são escassas. Os dados fornecidos ao Expresso pelo gabinete da ministra Alexandra Leitão, que centraliza a questão do teletrabalho, dão conta de que “desde 1 de janeiro de 2022, data da entrada em vigor da Lei n.º 83/2021, foram dirigidos à IGF seis denúncias e um pedido de parecer relativo a situações de teletrabalho, dos quais quatro se referem a autarquias locais e três a entidades da administração central”.
As denúncias, avança fonte do MMEAP, “estão relacionadas com a recusa e a falta de resposta dos empregadores públicos a pedidos de teletrabalho e com o incumprimento do regime de teletrabalho no período em que este foi obrigatório”, o que aconteceu entre 27 de dezembro e 9 de janeiro. O gabinete da ministra esclarece que “no âmbito das suas competências enquanto autoridade de auditoria, a IGF analisa as participações cívicas e reúne os elementos de informação necessários à verificação do cumprimento da lei, remetendo para as inspeções gerais setoriais as matérias que se inserem nas respetivas áreas governativas”.
Informação escasseia
No sector privado, escasseia informação. O Expresso questionou a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) sobre o número de denúncias reportadas à entidade fiscalizadora desde que a nova lei entrou em vigor, bem como quanto à natureza dessas denúncias. A ACT fez saber que “não dispõe de informação desagregada em matéria de teletrabalho, com o detalhe solicitado”, acrescentando que, por esse motivo, “não é possível responder em tempo útil às questões apresentadas sobre queixas”.
Contudo, a autoridade remete para um balanço da ação inspetiva nacional que realizou já este ano, com o objetivo de verificar o cumprimento da obrigatoriedade do teletrabalho e da organização desfasada de horários que vigorou entre a última semana de dezembro e o dia 9 de janeiro de 2022. “Foram fiscalizados pelos inspetores da ACT um total de 973 empresas e 1.093 locais de trabalho, tendo sido abrangidos um total de 14 mil trabalhadores. Foram detetadas 294 situações irregulares e, até à data, foram já corrigidas 54% dessas situações”, nota a ACT.
Entre as 294 infrações identificadas, a autoridade inspetiva reporta que “as mais frequentes estiveram relacionadas com matérias de segurança e saúde no trabalho, exposição a agentes biológicos, organização dos tempos de trabalho ou prescrições mínimas de segurança no local de trabalho”. Apenas seis infrações eram relativas ao não cumprimento do teletrabalho obrigatório, vinca.
No total, foram adotados 103 procedimentos inspetivos e instaurados nove processos contraordenacionais, com uma moldura sancionatória que pode ir até um máximo de 40,5 mil euros. A ação foi direcionada para locais de trabalho com base em indicadores de risco de incumprimento, bem como em pedidos de intervenção existentes. “Foi no distrito de Lisboa que se concentrou o maior número de empresas visitadas (20,8% do total), seguido do distrito Porto (com 14,5%), Braga (9,7%) e Setúbal (9,4%)”, avança a ACT.
Fonte: Expresso
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