Marcelo preocupado com evolução negativa de índice de perceção da corrupção
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De acordo com os dados da Transparência Internacional, Portugal obteve 57 pontos no índice de perceção da corrupção de 2024, um dos piores resultados da Europa Ocidental.
O Presidente da República manifestou-se esta terça-feira preocupado com a evolução negativa do índice de perceção da corrupção em Portugal e defendeu que "os mecanismos têm de ser renovados e melhorados permanentemente".
Em declarações aos jornalistas, na sede da Cruz Vermelha Portuguesa, em Lisboa, Marcelo Rebelo de Sousa assinalou os dados do índice de perceção da corrupção de 2024 hoje divulgados pela organização Transparência Internacional.
"Não deixa de ser uma evolução negativa e preocupante aquela que ocorreu neste último ano e nos últimos anos", declarou o chefe de Estado.
Recordando os alertas que fez sobre esta matéria, "nomeadamente em sessões de abertura do ano judicial", Marcelo Rebelo de Sousa defendeu que "os mecanismos têm de ser renovados e melhorados permanentemente".
Segundo o Presidente da República, o combate à corrupção passa "pelo funcionamento da investigação, os meios de investigação, os recursos de investigação, o tipo de entidades que participam nessa investigação também fora do poder judicial".
"A reforma da justiça, obviamente, é um ponto que neste momento parece colher o acordo muito amplo, diria de regime, na sociedade portuguesa. Mas além disso, a entidade dedicada à matéria da transparência demorou algum tempo a ser criada, a funcionar", apontou.
Referindo-se à Entidade para a Transparência, o chefe de Estado acrescentou que "ela substituiu em parte uma entidade que funcionava junto ao Tribunal de Contas" e considerou que a demora nesse processo, como no da extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), tem "muitas consequências na vida dos portugueses".
Na sua opinião, em matéria de corrupção, como em matéria de segurança, "o que interessa não é a segurança em abstrato, nem é a corrupção que existe ou não existe, é qual é a imagem que as pessoas têm acerca da corrupção e acerca da segurança".
"Porque é essa perceção que gera insegurança, e é essa perceção que gera maior ou menor confiança no combate à corrupção", sustentou.
De acordo com os dados da Transparência Internacional, Portugal obteve 57 pontos no índice de perceção da corrupção de 2024 -- numa escala de 0 a 100, em que 0 corresponde à perceção de muito corrupto e a 100 de muito transparente --, um dos piores resultados da Europa Ocidental, com uma queda de quatro pontos face ao ano anterior.
Marcelo Rebelo de Sousa realçou que a perceção de corrupção "tem uma evolução negativa em vários países europeus, em vários países de língua oficial portuguesa, mas tem uma perceção negativa em Portugal, comparando com valores nomeadamente a partir de 2012 ou até mais antigos".
A partir destes dados, para o Presidente da República "surge uma questão que tem a ver com a imagem que os portugueses têm dos mecanismos de combate à corrupção".
"Tem a ver com o funcionamento da justiça em termos de tempo, tem a ver com o funcionamento da entidade que tem tido a seu cargo, criada há poucos anos, a matéria da transparência, tem a ver com a pedagogia sobre a corrupção, tem a ver com um conjunto de fatores, olhando para os depoimentos que são dados", elencou.
Queda de Portugal no índice de corrupção reflete fracasso no combate, diz Frente Cívica
A queda de Portugal no Índice de Perceção da Corrupção 2024 "reflete o fracasso" do combate à corrupção, "sobretudo a corrupção política", e que observadores internacionais "não se deixam influenciar por mera retórica" de medidas anunciadas, defende Frente Cívica.
Numa análise aos resultados de Portugal no índice divulgado hoje pela Transparência Internacional, o vice-presidente da associação Frente Cívica, João Paulo Batalha, disse à Lusa que o "resultado atípico" do país, que num ano caiu quatro pontos na classificação e nove lugares na tabela para a sua pior classificação de sempre (43.º lugar) "reflete o fracasso no combate à corrupção, baseado em reformas legislativas, umas em cima das outras sem aplicação concreta".
O problema coloca-se sobretudo ao nível da corrupção política, defende João Paulo Batalha, que sublinha que no índice de 2023, apesar de já ter sido divulgado após a queda do Governo de António Costa na sequência da 'Operação Influencer', a classificação ainda não refletia esse caso judicial, que afetou diretamente o gabinete do primeiro-ministro.
Casos como o da 'Operação Influencer' ou o processo 'Tutti-Frutti' revelam uma captura dos políticos e da influência política por interesses privados, referiu o vice-presidente da Frente Cívica, num país em que existe a "perceção reiterada de que é preciso conhecer os políticos para conseguir fazer avançar projetos e negócios".
"Define-se a corrupção como fenómeno de funcionários públicos e de repartições públicas, mas o maior problema é a corrupção política", frisou o responsável.
Para João Paulo Batalha, o índice deste ano "demonstra de forma mais cruel e vincada que os observadores internacionais não se deixam convencer por mera retórica" de medidas anunciadas sem resultados práticos visíveis, com relatórios internacionais a demonstrarem recorrentemente o atraso do país na aplicação de recomendações.
A repercussão de casos como o da 'Operação Influencer' neste índice explica-se pela sua grande dimensão e pelas altas figuras do Estado atingidas, referiu o responsável.
"Quando há casos de grande dimensão que envolvem o Estado ao mais alto nível é natural que cause incerteza e insegurança, que imediatamente se repercutem. Mas o índice está desenhado para ter algum distanciamento", explicou João Paulo Batalha, acrescentando que o que está refletido no índice é uma multiplicidade de fontes externas e independentes que avaliam a qualidade das democracias e não "uma sondagem de opinião de residentes no país", tornando os resultados mais imunes a dados não fundamentados.
A qualidade das democracias e da associação de maior corrupção a países onde o Estado de Direito falha é outra questão levantada pelo Índice de Perceção da Corrupção 2024, referiu o vice-presidente da Frente Cívica, que sublinha que Portugal se encontra no grupo das democracias com falhas e que a situação na Europa se está a degradar, acrescentando que, em casos como o da Hungria, a União Europeia, por exemplo, "não tem sido suficientemente assertiva a punir Estados com más práticas".
Fonte: Diário de Notícias
Foto: Paulo Spranger