Terrorismo: Portugal deve estar atento ao possível regresso de famílias de extremistas
Radicalizados são cada vez mais jovens e não estão na sua maioria nas grandes cidades. Especialista alerta para problema a curto prazo que já ocorre noutro países e fala na importância de seguir pistas e acompanhar suspeitos.
Portugal deve ter atenção ao possível regresso ao país de mulheres e filhos de combatentes terroristas portugueses que foram para a Síria e para o Iraque.
O alerta foi feito pela procuradora do Ministério Público que investiga no DCIAP as suspeitas de crime de terrorismo no nosso país.
Cláudia Oliveira Porto falava numa formação do Centro de Estudos Judiciários, captada pela Justiça TV, quando chamou a atenção de juízes e magistrados para este facto.
" Quando foi a altura do califado do Estado Islâmico houve vários combatentes terroristas estrangeiros europeus que se deslocaram para Síria e Iraque. Com o desmantelamento do califado, muitos dos filhos e das mulheres (os combatentes tinham mais que uma mulher) foram colocados em campos de refugiados na Síria (um deles Al Hol). Nos últimos anos aconteceu nos outros países, e vai passar-se em Portugal possivelmente, vamos ter o regresso destas mulheres e filhos e há menores portugueses e mulheres portuguesas também”.
“Estas crianças são vítimas, viram muitos traumas, nasceram nos campos e na altura do califado. Não se sabe o nível de radicalização, é possível que num futuro próximo voltem a Portugal. É preciso estarmos preparados e termos a noção do que pode vir a acontecer."
Dirigindo-se aos formandos da sessão no CEJ, a magistrada acrescentou: “Lembrem-se que são vítimas, mas podem também ser um problema para a segurança".
A especialista revelou ainda que em Portugal, à semelhança da tendência europeia, os radicalizados são cada vez mais jovens.
"A idade destes jovens radicalizados tem vindo a diminuir e há casos noutros países, não são muitos, mas já há vários, que correm contra menores de 16 anos. Dois terços dos suspeitos de terrorismo na europa ocidental são teenagers", avisou.
Cláudia Oliveira Porto afirmou que "a radicalização de jovens está a aumentar” para falar depois sobre o papel do digital.
“As plataformas e redes sociais contribuem para a disseminação do discurso de ódio e ideologias radicais. As organizações terroristas manipulam o algoritmo para que os adolescentes fiquem expostos à propaganda terroristas e recrutam assim jovens para que, em seu nome, pratiquem atos violentes que provoquem o terror que depois reivindicam, eles são os chamados lone actors".
A procuradora Cláudia Oliveira Porto sublinha que os casos suspeitos não surgem localizados obrigatoriamente nas grades cidades e explica porquê.
“Não contem que seja só nos grandes centros, tenho vários suspeitos nos açores e no interior do pais, não são grupos organizados, delinquentes sem aparente ocupação, estamos a falar de jovens radicalizados, sozinhos, no interior de um quarto em frente a um computador", esclareceu.
Afinal o que está identificado pelas autoridades como sendo muitas vezes motor para o radicalismo?
"Um jovem que tenha sofrido racismo, bullying, discriminação, que necessite de uma identidade, de uma pertença, de um grupo, que tenha sentido raiva, trauma, por curiosidade ou tédio, por problemas de saúde mental - e está muitas vezes associado a isso -, por conexão com alguém do ponto de vista extremista e que pode estrar do outro lado do mundo."
A magistrada explicou também o que seguem as autoridades na hora monitorizar ou identificar um suspeito: "Redes sociais, conversações do suspeito, Facebook , Instagram, Telegram, WhatsApp, Tiktok, tudo o que são informações em fonte aberta, fontes humanas, glocalização para perceber a motivação do agente e ideologia."
A procuradora revelou que a investigação “procura contactos radicalizados com outros indivíduos, teóricos radicais, músicas, conversas, estados de espirito, textos doutrinários, viagens e percursos”.
Mas a investigação também se faz com recurso a escutas mais longas do que as do crime de banditismo, mas também com agentes encobertos e já existem os digitais.
"Um encoberto digital num grupo que nos traz prova e temos de ter outro encoberto em termos físicos que contacte com os indivíduos. É preciso coordenação entre os dois para não serem descobertos. Era fundamental termos encobertos árabes, não temos ainda, mas estamos a evoluir e num futuro próximo acredito que as coisas vão melhorar”, acrescentou Cláudia Oliveira Porto.
Fonte: Liliana Monteiro/Rádio Renascença
Foto: Atef Safadi/EPA