Nova eleição, (quase) os mesmos problemas na governação

Um ano depois, os portugueses voltaram às urnas e deram a vitória à AD, mas sem maioria absoluta. Garantia de governabilidade não foi atingida.

Depois de uma queda intempestiva do Governo de Luís Montenegro, muito se cenarizou sobre quem ganharia e quem perderia com esta nova ida às urnas. Com os resultados do ato eleitoral deste 18 de maio de 2025, torna-se claro que a AD reforça votação, o Chega e a Iniciativa Liberal também, enquanto o PS foi duramente castigado pelos eleitores.

Houve muitas mudanças, até com a entrada de um novo partido no hemiciclo, o madeirense JPP, mas há um problema estrutural que se mantém no que toca à governação e à estabilidade do Executivo.

O cenário mais colocado até aqui seria um Governo englobando AD e Iniciativa Liberal, mas ao fim do dia isso não chega para formar um Executivo com suporte de maioria absoluta no Parlamento. Ou seja, o Governo de Luís Montenegro continua à mercê da vontade da oposição, tanto na legislação emanada da Assembleia da República como, sobretudo, no que toca a possíveis moções de censura ou chumbos de Orçamento do Estado.

Com os votos da emigração ainda por contar, AD e IL têm 98 deputados, muito longe da maioria absoluta (116). Talvez por isso, Rui Rocha afastou de imediato a entrada no Governo. “Tinha dito que seríamos garantia de governabilidade, de uma solução para o país, na medida em que isso dependesse de nós. Mas olhando para os resultados, vemos que as maiorias possíveis estão constituídas. No Parlamento vamos continuar a defender as nossas ideias”, referiu o presidente dos liberais.

Mesmo um acordo apenas parlamentar não teria qualquer utilidade para a AD, porque a coligação PSD/CDS tem mais mandatos do que toda a esquerda junta. Um qualquer acordo não só não garantiria maioria absoluta como a AD não precisa da IL para ter mais votos do que a esquerda toda junta.

No atual Parlamento, a AD tinha um total de 81 deputados (e 90, se contarmos a IL); a esquerda, no total (incluindo o PAN), tinha 92. Ou seja, se o Chega não se metesse no processo, o Governo ficaria à mercê da oposição de esquerda. Agora, o cenário mudou exatamente aí. A AD, sozinha, tem para já 89 mandatos, enquanto toda a esquerda não chega aos 70.

Porém, a trama adensa-se ainda mais no que toca ao PS, que sofreu uma pesada derrota, ficando (para já) igualado ao Chega, ao perder 20 deputados face ao resultado de 2024. Pedro Nuno Santos assumiu a responsabilidade pelo resultado e anunciou a saída. “Assumo as minhas responsabilidades como sempre fiz no passado. Vou pedir por isso eleições internas às quais não serei candidato”. Mas, não sendo candidato, deixou uma sugestão à próxima liderança, de que não deve viabilizar um Governo AD. “A mim não cabe ser o suporte deste Governo e esse papel também não deve caber ao PS”, diz Pedro Nuno Santos. Resta saber se o PS tem condições para escolher um novo líder antes dos momentos decisivos acerca da constituição do Governo e que posição terão os socialistas nessa altura.

O que isto significa é que não é líquido que o PS viabilize a formação do Governo ou a aprovação do Orçamento do Estado para 2026. Se tal não acontecer, a decisão fica nas mãos do Chega. André Ventura tem insistido em que o seu partido tem de ir para o Governo com o PSD, mas tal obrigaria a uma enorme mudança de posição por parte de Luís Montenegro. Na noite eleitoral, Montenegro não repetiu a já célebre frase “Não é não” acerca do Chega mas, questionado sobre isso, salientou que mantém a palavra e o rumo seguido até aqui. E lembrou que a AD aumentou muito a diferença para o segundo classificado, entre as eleições, alegando que isso dá força e legitimidade acrescida à solução governativa que vem de trás. “O povo português não quer outro Governo nem quer outro Primeiro-ministro”, afirmou.

Na prática, não aconteceu aquilo que Marcelo Rebelo de Sousa tanto pediu: estabilidade e condições de governabilidade. A AD ganha mandatos face ao que tinha mas sem que tal tenha utilidade real. O Chega sobe oito mandatos, para 58, mas a manter-se o “não é não” de Luís Montenegro, a utilidade desse ganho também é questionável. E o PS, que nas eleições anteriores ficou mesmo em cima da AD, nem que “federasse” toda a esquerda conseguiria sequer ter mais peso que a AD.

O resultado será, novamente, um Governo minoritário AD, com mais mandatos mas as mesmas condições parlamentares.

Fonte: Eco
Foto: Bruno Figueiredo/Euronews